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·3. Dezember 2025

À conversa com o pai de Mateus Mide: «Ele gosta das comparações ao Vitinha»

Artikelbild:À conversa com o pai de Mateus Mide: «Ele gosta das comparações ao Vitinha»

Emílio Peixe em 1991. Mateus Mide em 2025. A lista é mínima, quase irreal, e por isso mesmo obriga-nos a parar. Portugal voltou a ter um melhor jogador de um Campeonato do Mundo de seleções jovens, algo que parecia reservado aos capítulos mais distantes da história.

Para contar a história com honestidade, o zerozero decidiu ir à raiz: Adriano Mide, o pai, o único que acompanhou todas as fases - as públicas e, sobretudo, as invisíveis. Foi o primeiro a ver o talento, o primeiro a perceber as dúvidas e o primeiro a sentir o impacto do que aconteceu em Doha, no Catar. As primeiras sílabas que lhe saem quando recorda tudo são curtas e definitivas: «A única palavra que consigo usar é: orgulho.» E, dito assim, com esta simplicidade, o peso torna-se ainda maior. Afinal, que peripécias esconde este pequeno génio, de seu nome Mateus Mide?


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Mar de rosas? Longe disso

O que Portugal viu em campo não explica o que o trouxe até ali. É Adriano quem o diz, sem floreados: «É um orgulho vê-lo a fazer história e a chegar a este patamar. É fruto de muita dedicação e empenho do Mateus.»

Esse «empenho» tem nome e tem preço. «A maior dificuldade? Acompanhar o crescimento dele e vê-lo a abdicar de várias coisas normais para a idade dele», recorda. «Tudo para conseguir um sonho que ele tanto deseja: tornar-se jogador profissional.» 

Não foi um processo romântico. Foi, muitas vezes, um processo solitário. «Abdicou muitas vezes de estar com amigos para descansar e para alcançar aquilo que tanto deseja. É muito dedicado naquilo que quer.»

Durante anos, Mateus não foi o «fenómeno óbvio» que agora parece. «Ele ainda não é um grande jogador, mas dentro do escalão dele é uma referência», sublinha o pai. Houve fases de brilho intermitente, jogos em que «desaparecia», momentos em que parecia faltar um clique. Esse clique chegaria mais tarde - por volta dos 12 anos - mas o trabalho nunca falhou.

E é por conhecer cada renúncia que, após o último suspiro daquela emocionante final com a Áustria, Adriano só conseguiu dizer uma coisa: «No final do jogo ele veio ter comigo a chorar, eu também estava a chorar, e só lhe consegui dizer: 'Tu mereces'». A mesma frase foi repetida minutos depois, quando Mide júnior foi eleito o melhor jogador da competição. Coisa pouca.

Mundial: sonho ou objetivo?

Antes do Europeu, havia crença. Antes do Mundial, havia prudência. «O Mundial? Era um sonho distante», admite Adriano. «Conseguiram conquistar o Europeu, mas o Mundial é algo muito maior.»

O discurso dentro do grupo mostra maturidade rara para a idade: «Eles não estavam ‘Ah, somos campeões da Europa, vamos lá ganhar o Mundial’. Tinham os pés no chão e acho que isso foi fundamental.»

A conquista não se explica só pelo talento individual. Explica-se pela consistência emocional. Explica-se por terem percebido que estavam num território completamente novo - e que nenhum estatuto os protegia. E explica-se pela forma como reagiram em campo: juntos, compactos, conscientes do que podiam (e não podiam) fazer.

«Há ali cinco ou seis jogadores muito acima da média», sublinha Adriano. E diz os nomes sem hesitar: «O [Rafael] Quintas, os dois laterais - o Banjaqui e o José Neto -, o guarda-redes, Romário Cunha, o Tomás Soares, o [Bernardo] Lima

Comparações com Vitinha

Dentro do campo, Mateus pertence àquela categoria rara de jogadores que pensam antes de tocar. O pai descreve-o com um misto de rigor e naturalidade: «O Mateus tem características semelhantes ao Vitinha. A leitura de jogo, a rápida execução… mas o Mateus tem uma aptidão maior para pisar terrenos ofensivos. É um médio-ofensivo com chegada à frente e que consegue fazer golos com facilidade.»

A comparação não nasce nas bancadas... nasce em casa. «Ele sempre gostou muito do Cristiano [Ronaldo], mas é fã do futebol do Vitinha. Ele tem orgulho em ser comparado ao Vitinha e não apenas pela barba [risos]. O Vitinha é um ídolo do Mateus.»

A frase que melhor explica o que o distingue é esta: «Ele tem coisas que não se ensinam.» Num país que produz médios como poucos no mundo, o dragãozinho parece vir de uma linhagem própria: percebe antes, acelera quando deve e trava quando se impõe. E, essencialmente, decide bem - uma das artes mais difíceis do futebol moderno.

Coração pintado de azul e branco

Aqui não há debate. Nem nuance. Nem hesitação. «O Mateus é FC Porto de coração», diz Adriano. «A mãe também é portista de coração e eu aprendi a gostar do FC Porto

Depois, a história que define tudo: «Lembro-me que aos 7, 8 anos ele teve um convite para ir treinar ao Benfica e recusou de imediato. Nem quis ir fazer o treino. Não queria sair do FC Porto

É uma fidelidade rara num futebol cada vez mais nómada. E ela mantém-se intacta: «Ainda no domingo fomos ao Estádio do Dragão e estávamos a falar sobre o sonho de pisar aquele relvado.»

O reconhecimento já começou: «Villas-Boas e Francesco Farioli já falaram com ele e com os outros jogadores que estiveram no Mundial.»

E o futuro, para Mateus, continua a ser dito com naturalidade: «O sonho do Mateus é chegar à equipa A do FC Porto e à seleção nacional.»

O papel da família

É aqui que a educação pesa. O pai não tem dúvidas sobre o seu papel: «Papel dos pais? É dar-lhe consciência. É importante a pessoa ter consciência daquilo que pode alcançar, mas, ao mesmo tempo, não esquecer o que fez para alcançar. Com muito trabalho, muita dedicação e continuar a fazer isso.»

«O exemplo do Rodrigo Mora é muito importante para ele ter noção que conquistou isto agora, mas ainda tem várias etapas até chegar à equipa A.» E acrescenta: «O Mora é o exemplo perfeito de um jogador que já mostrou que tem imensa qualidade, mas existem certas etapas pelas quais têm de passar antes de se afirmarem

O que Adriano quer para o filho é simples e real: «A nossa expectativa é que ele continue a fazer a história dele e que consiga cada vez mais entrar na história do futebol.»

«As coisas com o Mateus têm acontecido de forma natural, não tem de ter pressas. É importante que esteja preparado quando as oportunidades surgirem

Portugal ou Brasil?

O debate existe apenas para quem vê de fora. «Portugal ou Brasil? A decisão será dele», diz o pai, antes de clarificar tudo: «A minha opinião é que deve ser Portugal. O Mateus nunca morou no Brasil, ele é português e as raízes da sua formação são aqui. Ele vai jogar pela seleção de Portugal.» Nós, caro leitor, agradecemos.

O futuro ainda não existe, ainda não está escrito. Não importa, por isso, pensar nele e ansiá-lo de forma precoce. Talvez seja isso que estraga tantos jovens e talentosos prodígios do desporto-rei. Importa olhar para trás com um sentimento de dever cumprido, mas não esquecer da fome habitual na hora de regressar à rotina.

Tal como fez no dia desta entrevista: «Ele deve viver o momento, mas não esquecer que agora tem de voltar à rotina. Hoje já o fui deixar ao Olival», confessou Mide sénior.

A grandeza está aí: no hábito, não no pedestal. O sonho? Esse mantém-se o mesmo, mas agora com mais legitimidade: «O grande sonho dele é chegar à equipa A do Porto e à seleção A. E vai lutar por isso», garante.

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