Fussball Brasil
·10. Mai 2025
O relógio que parou e o tempo consertou: A volta do Hamburgo à Bundesliga

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·10. Mai 2025
12 de maio de 2018, às 17h37, horário local,
Felix Brych
apitou o fim de partida entre
Hamburger SV
e
VfL Borussia Mönchengladbach.
Aquele foi o momento em que a dor em Hamburgo atingiu seu ápice, marcando a última lembrança de um torcedor na elite do futebol alemão. O que ninguém sabia, porém, era que aquele seria apenas o início de um longo abismo.
O fim de maio de 2018 marcou o início de uma reestruturação.
Ralf Becker
assumiu como diretor esportivo do clube, chegando à cidade
Hanseática
com a missão de reorganizar o plantel do time e torná-lo competitivo para a segunda divisão. Becker trazia excelentes credenciais, veio do
Holstein Kiel
que disputou os play-offs de rebaixamento contra o
VfL
Wolfsburg
e quase alcançou o acesso em sua primeira temporada na
Zweite Liga
. O elenco foi remodelado, com 15 saídas e nove contratações, destacando-se os empréstimos de
Orel Mangala
(
Stuttgart
) e
Hwang-Hee Chan
(
RB Salzburg
). Com orçamento reduzido, o clube investiu apenas em
Khaled Narey
, do
Greuther Fürth
e manteve a base dos anos anteriores com:
Lewis Holtby
,
Gotoku Sakai
e
Aaron Hunt
. O técnico
Christian Titz
, permaneceu após a campanha final fracassada na
Bundesliga
, mas durou pouco, apenas 10 partidas sendo demitido com derrotas pesadas: 3 a 0 para o KSV Holstein Kiel (ex-clube de Becker) e 5 a 0 para o
SSV Jahn Regensburg
- até hoje é a maior derrota na história do
HSV
em casa.
Depois do inicio turbulento, o Hamburgo promove
Hannes Wolf
ao cargo de treinador principal e ressurge como um lobo na metade final do primeiro turno, com seis vitórias em sete partidas, conquistando o título do turno, com 37 pontos. No entanto, o returno foi fraco: apenas 19 pontos somados e um total de 56 ao fim da temporada encerrando o campeonato em quarto lugar. Para piorar, o técnico Hannes Wolf e o diretor esportivo Ralf Becker foram demitidos, e o
Werder Bremen
ultrapassou o HSV em número de partidas na Bundesliga na história.
Em 2019/2020, a prioridade era a experiência.
Dieter Hecking
, ex-Borussia Mönchengladbach, foi contratado para comandar o retorno à elite. O elenco recebeu os reforços:
Martin Harnik
(SV Werder Bremen),
David Kinsombi
(KSV Holstein),
Adrian Fein
(
FC Bayern München
),
Sonny Kittel
(
1. FC Ingolstadt
),
Tim Leibold
(
1. FC Nürnberg
) e
Lukas Hinterseer
(
VfL Bochum
), enquanto
Jonas Boldt
(ex-
Bayer Leverkusen
) e
Michael Mutzel
(ex-
TSG Hoffenheim
) assumiram as posições de diretor esportivo e olheiro-chefe, respectivamente. A campanha repetiu o padrão do ano anterior: primeiro turno forte (30 pontos, 2° lugar) e segundo turno fraco. A pandemia de
COVID-19
, trouxe ainda mais instabilidade, e o
CEO Bernd Hoffmann
deixou o conselho de administração após conflitos com Boldt e
Frank Wettstein
, conselheiro fiscal. Na volta da pausa da pandemia, uma palavra começou a ecoar com cada vez mais força: "quase".
Na 33ª rodada, HSV foi a
Heidenheim
, e estava vencendo a equipe do
1. FC Heidenheim
até os 10' minutos finais de partida, mas sofreu a virada em 15 minutos, caindo para o quarto lugar e perdendo a chance de acesso. O roteiro se repetiu em 2021: era 17 de abril, estádio
Bremer Brücke
, contra o
VfL Osnabrück
condenado à
3. Liga
, os comandados de
Horst Hrubesch
desperdiçaram o resultado de 2 a 1 e sofreram uma virada por 3 a 2. Em 2022, um dos golpes mais dolorosos: o Hamburgo após vencer o
Hertha Berlin
na capital, imaginou que a barreira entre a cidade as margens do
Rio Elba
e
Berlin
houvesse sido rompida. Contudo, as tropas do antigo militar da reserva
Felix Magath
, ídolo do HSV, derrotaram os
Dinos
, em casa, graças a um golpe de cabeça de
Dedryck Boyata
e um tiro de canhão de
Marvin Plattenhardt
.
Mutzel que veio como uma esperança foi defenestrado do clube como um bode expiatório e se juntou a uma lista de profissionais (
Daniel Thioune
, Dieter Hecking, Ralf Becker, Hannes Wolf e Christian Titz) que passaram pelo HSV como curativos temporários e incapazes de resolver o problema da equipe. Naquele momento, o Hamburgo tornou-se um "Sísifo de chuteiras", condenado a empurrar a pedra até o meio da montanha para vê-la rolar de volta.
Em 2022, sem Mutzel, mas com Boldt, o astuto técnico
Tim Walter
(contratado na temporada 2021/22) e com um elenco competitivo composto por:
Ludovit Reis
(
FC Barcelona
),
Jonas Meffert
(KSV Holstein),
Mario Vuskovic
(
HNK Hadjuk Split - CRO
),
Sebastian Schonlau
(
SC Paderborn
) e Robert Glatzel (
Cardiff City FC - GAL
), o HSV atingiu o fundo do poço. A continuidade era a palavra da vez no clube. A base do time citado acima, ganhou o incremento de
Jean-Luc Dompé
, vindo do
SV Zulte Waregem
, da
Bélgica
, na janela de transferências de janeiro de 2023. A equipe manteve seu estilo de jogo com posse de bola, de pressão intensa sem ela e ataques ferozes usando os corredor lateral, o que levou o time a marcar 70 gols, mas, como sempre, o final foi trágico e este, em especial, com requintes de crueldade. 28 de maio de 2023, 34ª rodada, o Hamburgo venceu o já rebaixado
SV Sandhausen
(3 a 0), a torcida não se conteve, invadiu o gramado e com direito a lágrimas escorrendo dos olhos, o locutor do estádio trouxe a notícia cruel: 1. FC Heidenheim 3, SSV Jahn Regensburg 2, o resultado empurrou os Dinos para a quarta posição. A alegria que tomou a ensolarada cidade de Sandhausen foi engolida pela tristeza e decretou a morte da temporada antes do enterro. Pois, nos play-offs, o HSV foi humilhado pelo VfB Stuttgart (6 a 1 no agregado).
A temporada 2023/24 começou com esperança (no fim do primeiro turno, o Hamburgo foi o segundo colocado com apenas quatro derrotas em 17 partidas), mas a demissão de Tim Walter após maus resultados entre a 19ª e a 21ª rodada levou a contratação de
Steffen Baumgart
(ex-
1. FC Köln
). A aposta não deu certo: o clube perdeu suas chances de acesso após uma derrota para o SC Paderborn.
A virada do clube foi sendo construída a passos lentos. No fim da temporada 2023/2024, Boldt deixou o HSV após quatro anos.
Stefan Kuntz
(ex-técnico da seleção turca) retornou ao futebol, mas em uma nova função, a direção esportiva. E apesar das críticas recebidas, Steffen Baumgart manteve-se no comando do Hamburgo até o fim de 2024, deixando um legado ambíguo. Seu início foi promissor - a equipe somou 20 pontos em 13 partidas da 2. Bundesliga 2024/25 -, e soube extrair o potencial do jovem talento
Ransford Königsdörffer
. Contudo, após cinco jogos sem vencer entre o fim de outubro e o mês de novembro, seu ciclo se encerrou, abrindo caminho para uma aposta ousada da diretoria.
A chegada de
Merlin Polzin
, de 34 anos, representou um verdadeiro "
all-in
(tudo ou nada)" institucional. O jovem técnico não apenas resgatou o DNA ofensivo do HSV - mais próximo do estilo de posse adotado por Tim Walter do que o futebol direto de Baumgart -, como também realizou um trabalho notável de recuperação psicológica e técnica de peças-chaves. Ludovit Reis e Jean-Luc Dompé, este último deixado de lado por Baumgart, redescobriram seu melhor futebol, enquanto novas contratações como
Davie Selke
,
Daniel Elfadli
e
Emir Sahiti
integraram-se perfeitamente ao projeto.
O impacto de Polzin é notável nos momentos decisivos. Vitórias consistentes contra rivais diretos pelo acesso,
1. FC Magdeburg
, 1. FC Nürnberg,
Fortuna Düsseldorf
e
1. FC Kaiserslautern
demonstraram a solidez construída, com apenas tropeços pontuais (
Karlsruher SC
,
SC Paderborn
e
SV Elversberg
) nos jogos decisivos. Seu mérito foi ainda maior a devolver a confiança a jogadores como
William Mikelbrencis
, Sebastian Schonlau,
Lukasz Poreba
,
Silvan Hefti
,
Adam Karabec
e
Dennis Hadzikadunic
, formando um coletivo coeso onde antes havia apenas indivíduos.
SC Preußen Münster v Hamburger SV - Segunda Bundesliga
MUENSTER, ALEMANHA - 07 DE FEVEREIRO: Davie Selke do Hamburger SV ##cel durante o jogo da Segunda Bundesliga entre SC Preußen Münster e Hamburger SV no Preussenstadion a 07 de fevereiro de 2025 em Muenster, Alemanha. (Foto de Christof Koepsel/Getty Images)
Destaque especial merece Davie Selke. Assim como o próprio Hamburgo, o atacante de 23 gols em 32 partidas ressurge após anos de ostracismo, completando uma narrativa de redenção que vai além do mero acesso. Polzin, por sua vez, consagrou-se não por feitos isolados, mas por construir aquilo que o clube almejava desde 2018: uma equipe onde relógios parados cedem lugar a mecanismos bem ajustados.
Em 2025, o relógio do Volksparkstadion já não existe mais - não porque não tenha sido consertado, mas porque o tempo, esse velho adversário, finalmente se rendeu à persistência. Agora, as coordenadas de localização do estádio (substituta do relógio) marcam não apenas uma posição geográfica, mas o ponto de partida para uma nova era na Bundesliga.