Zerozero
·23. Oktober 2025
Visita à intimidade do clube mais antigo do mundo (com um guia especial)

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·23. Oktober 2025

1862. Ano da fundação do Notts County, altaneiro proprietário do Meadow Lane. 163 anos de existência, orgulhosamente «o mais antigo clube de futebol profissional do mundo».
O zerozero junta dois em um. Já que o FC Porto joga ali a escassos metros - sim, o vizinho endinheirado do City Ground mora a 500/600 metros - vamos então à sacramental visita. Isto é território sagrado, uma viagem down to memory lane à intimidade de um emblema único na cena mundial.
O convite é aceite e o clube coloca-nos à disposição o melhor guia possível. Les Bradd, maior goleador na longeva caminhada dos The Lambs, é o anfitrião perfeito. Junta emoção ao detalhe e informação explícita à realidade de 2025.
Mais tarde, portador de valiosíssimos documentos antiquíssimos, surge o historiador Mick Chappell. Sentados à mesa, folheiam momentos icónicos do passado do Notts County e elogiam os atuais proprietários do emblema da League Two.
«Estou cá desde 1967 e nunca vi bosses assim tão empenhados e comprometidos», exclama Les Bradd, referindo-se aos dinamarqueses Alexander e Christopher Reedtzm, irmãos que em 2019 adquirem o capital maioritário da decana instituição.
«Eles disseram-nos assim: 'Viemos investir no Notts County e não comprar o Notts County'. Isso faz toda a diferença.»
O encontro arranca na main reception. Les é um cavalheiro de 77 anos, corpulento, um striker feroz e fisicamente insuperável nos seus dias de jogador.
«Conhece o senhor da foto no meio?», pergunta-nos, em jeito de brincadeira. E lá está ele, a envergar a camisola listada a preto e branco, 125 golos no campeonato, 4 na FA Cup e mais 7 na League Cup.
O quase octogenário sobe as escadas para o primeiro piso e leva-nos à Directors' Suite. Sala ampla, moderna, arejada. É aí que um grupo de sócios premium se junta para jantar antes de todos os jogos em Meadow Lane.
«Estes proprietários perceberam que o clube não sobrevive só da bilheteira e dos sponsors. Então criaram três modalidades novas e extremamente rentáveis», conta Les Bradd, atualizadíssimo em relação à estratégia do clube.
«Temos agora um clube de padel que nos rende mil libras por dia e um espaço chamado The Nest, onde os adeptos se reúnem para conviver no pré-jogo. Música, comida e 40 mil libras de lucro para o clube. Além disso, agora há a hospitability. Em várias salas do estádio, um grupo determinado de sócios paga uma quantia e tem o programa completo: refeição, contacto com a equipa e o jogo.»
É no The Nest, de resto, que os adversários do Nottingham Forest convivem antes dos jogos. Mais uma forma de o Notts County rentabilizar um espaço que estava abandonado. «Os fãs do FC Porto vão encher isto, estamos à espera de 700 portugueses.»
A descida ao nível do relvado leva-nos aos balneários e a um pormenor delicioso. A equipa da casa e a visitante ficam lado a lado, «sem problemas». Como seria se a ideia chegasse a Portugal?
«Tivemos um treinador, o Kevin Nolan, que nos disse que o Notts County era demasiado amável com os adversários», graceja Les Bradd. «Então sugeriu-nos uma coisa: construir uma parede a meio do balneário visitante para fazê-los sentir encurralados. Acho que tem resultado.»
Mais à frente, antes da entrada na sala 1862, também pensada para servir os sócios, surgem-nos camisolas de épocas diferentes. Muitas delas são patrocinadas por Jake Bugg. Ele mesmo, o autor dos hits Lightning Bolt e It's True.
«O Jake é nosso adepto e ajudou muito o County durante alguns anos. Quis ser o main sponsor das camisolas de jogo e atraiu bastantes jovens. É um good lad.»
O Notts County não disputa a Premier League desde 91/92. E o único título data de... 1897. Les Bradd encolhe os ombros, elogia a ligação entre clube e comunidade e mostra otimismo para o futuro, enquanto nos leva a mais zonas de acesso privado.
«O nosso balneário tem estas luzes no teto. O treinador prefere esta cor amarelada, para serenar a equipa. Se for necessário um SOS, isto muda para vermelho. É mesmo assim», continua o antigo goleador, sempre a dar exemplos da própria carreira e a mencionar antigos colegas de equipa.
«Eu jogava no Rotheram e vim aqui à experiência. Fiz um treino e o coach não desgostou: 'Tens cabedal, tens força, podes ficar'. Tive colegas fabulosos a ajudar-me, numa altura em que os defesas eram violentos. O truque para os golos? Saltar antes deles e bloquear os guarda-redes. Os árbitros nunca marcavam falta nesses lances.»
Do túnel apertado, escuro, já vemos o verde do relvado. Perfeito. No sábado há receção ao Cambridge e nada pode falhar na organização. Em caso de vitória, os magpies de Nottingham sobem à zona de subida à League One.
O que sente Les Bradd ao olhar as balizas, as áreas, a relva?
«Sinto-me mais jovem. Sinto que ainda podia ser feliz lá dentro.»
A emoção é natural, compreensível. «Temos um grupo de antigos jogadores do Notts County. Chama-se Memory FC. Há colegas meus que têm Alzheimer, que não se lembram do que fizeram há dez minutos, mas que têm os detalhes de todos os jogos da época 67/68 na cabeça. Melhor do que isto não há.»
A origem das camisolas pretas e brancas da Juventus mora aqui, em Meadow Lane. A história completa pode ser lida AQUI. Mick Chappell, um poço de sabedoria, traz livros pesadíssimos debaixo do braço e junta-se à conversa na sala da direção.
É a última paragem.
«A Juventus jogava de cor-de-rosa... pálido. Veja bem. As camisolas eram vermelhas e depois de uma lavagem ficaram esbatidas. Um rapaz daqui (John Savage) trabalhava em Turim e ofereceu-lhes camisolas do Notts County. Já fizemos alguns amigáveis contra eles.»
A precisão das datas é impressionante. O amor pelo Notts County inigualável. O desprezo por aqueles «do outro lado da ponte» [o rio Trent separa Meadow Lane do City Ground] inegociável.
«Já fomos maiores do que eles. Depois apareceu um tipo chamado Brian Clough e deu cabo de tudo», atira, num típico humor britânico e respetiva gargalhada.
O texto ajuda a perceber a maravilha que é o Notts County. O vídeo associado [na parte superior] mostra em imagens algumas das zonas visitadas pelo zerozero.
Os abraços no final são de reconhecimento. É só isso que Les e Mick pedem.
«Fale bem em Portugal do nosso amor supremo.»









































