Zerozero
·25 de septiembre de 2025
A relação «amor-ódio» entre Mourinho e Peixoto: «Ele esteve para desistir do César»

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·25 de septiembre de 2025
Com o avançar da carreira de José Mourinho, aumentam os antigos jogadores do Special One a fazerem também a transição para os bancos. Esta sexta-feira, o treinador do Benfica vai reencontrar César Peixoto, com quem teve uma relação agitada no FC Porto.
Em 2002, ano da chegada do extremo às Antas, técnico e futebolista partilhavam a irreverência e as personalidades fortes, que levaram a momentos intensos entre ambos.
Os caminhos de José e César voltam a cruzar-se esta sexta-feira na Luz, momento perfeito para recordar alguns episódios desta relação, descrita como de «amor-ódio».
A época 2001/02 marcou a explosão de César Peixoto no futebol português. O jovem tinha dado o salto do modesto Caçadores das Taipas para o Belenenses e não precisou de tempo para fazer estragos na I Divisão.
O talento do canhoto saltava à vista e não faltavam interessados na sua contratação. A preparar o que vinha a ser uma fantástica era do FC Porto, José Mourinho mexeu-se para assegurar os seus serviços.
«O Belenenses tinha ganho ao FC Porto por 3-0, num jogo em que fiz um golaço de fora da área. Lembro-me do Mourinho cumprimentar-me após o jogo e dizer-me algo como: "Em breve vamos encontrar-nos". Na semana seguinte começaram os contactos», revelou César Peixoto ao zerozero no programa Ponto Final, conduzido pelo jornalista Humberto Ferreira.
«Tinha SL Benfica, FC Porto, Sporting interessados, além de clubes como o Inter e o Middlesbrough. Tinha muita vontade de regressar ao norte do país, a minha casa, e assinei pelo FC Porto», afirmou.
Num espaço de um ano, César Peixoto saltou do futebol amador para a exigência azul e branca. Destemido e descarado, a forma como o jovem via o futebol originou muitas dores de cabeça a José Mourinho, fã do seu talento.
Quando as coisas pareciam estar a encarrilar, uma contrariedade, de impacto na restante carreira do minhoto, bateu à porta. A rutura de ligamentos no joelho esquerdo travou a afirmação do jovem César, que demorou anos a reencontrar-se dentro dos relvados.
«Foi um momento que marcou a minha carreira, que acredito podia ter tido outra dimensão. Em Marselha, um jogo decisivo para as nossas contas na Liga dos Campeões. Estava a ter regularidade e falava-se de seleção. Com essa lesão não voltei a jogar nessa campanha europeia.»
«Foram oito meses parados. Um revés muito grande. Perdi velocidade, capacidade no um para um. Ganhei alguns medos e perdi capacidades, passei a ser um jogador diferente», reconheceu César Peixoto.
«É a primeira vez que uma lesão tão grave acontece com um jogador meu desde que sou treinador e é uma sensação muito estranha. Por não poder contar com o jogador por muito tempo e por se tratar do César. É uma tristeza muito grande», desabafou, naquele momento, José Mourinho.
«Ele trabalhou muito para chegar aqui. Na época passada andámos longe um do outro. O seu enorme talento não era suficiente para o considerar um bom jogador. Acontecer-lhe isto agora, que a qualidade começava a ser alicerçada taticamente, é um drama», acrescentou o Special One.
A recuperação foi demorada, mas o extremo transformado em lateral ainda conseguiu dar o seu contributo no final dessa época, de boa memória para os adeptos do FC Porto.
A chispa com José Mourinho, porém, continuou viva e a desconfiança voltou a ganhar força após um acidente de viação sofrido pelo jogador, muito perto do Centro de Estágios do Olival, a dias de encontro com o Benfica no Jamor.
«Lembro-me que o César, a determinada altura, teve um acidente de carro a ir para o Olival e o Mourinho deu-lhe uma descompostura. Foi na altura dos anos dele. O César disse-me: 'Estive a falar com o mister e ele disse-me que só não me dispensava agora porque não podia. Não conta mais comigo até ao final da época porque não tive um comportamento digno. Eu não fiz nada'», explicou Costinha, uma das referências daquele plantel, em conversa no Porto Canal.
«Bato à porta do balneário do Mourinho e o mister diz ao André [Villas-Boas]: 'Diz a esse gajo que se vem aqui defender o César Peixoto pode ir já para trás'. Pedi ao mister para o deixar treinar comigo e que ficava responsável por ele, mas o mister disse-me para desistir, que já tinha tentado de tudo e ele não merecia, apesar de ter uma qualidade fantástica», detalhou o Ministro.
«Tínhamos um grande espírito de entreajuda no plantel, mas o Mourinho esteve mesmo para desistir do César. Felizmente as coisas passaram.»
Em 2018, em entrevista ao jornalista Rui Miguel Tovar publicada no Observador, César Peixoto revelou mais sobre a agitada relação com o treinador. O individualismo do canhoto, em especial, não agradava ao técnico, que aplicou estratégias sui generis para tentar convencer o jogador.
«A minha relação com o Mourinho era de amor-ódio. Ou tratava-me bem, ou nem dizia o meu nome. Quando distribuía os coletes, dizia os nomes de todos os jogadores, mas quando era eu dizia 'joga o outro' a olhar na minha direção.»
«No final da época 2003/04, o Rui Faria revelou-me a estratégia deles (risos). Em alguns treinos existia muita porrada e eu levava a sério, especialmente do Secretário e do Jorge Costa. Entradas a sério! A razão? O meu individualismo e gosto pelo um para um. Aliás, quando cheguei às Antas, o público comparava-me ao Futre pela velocidade e pelos dribles.»
«Nesses treinos, era só bater, mas o Mourinho mandava sempre seguir. Quando eu fazia uma falta de nada, ou nem sequer fazia falta, o Mourinho apitava. Bem, eu passava-me e mandava-o para o c******. Lá ia para o banho. Fui muitas vezes para o banho.»
«Nessa conversa, o Rui Faria revelou-me que era tudo combinado entre a equipa técnica, o Jorge Costa e o Secretário. A intenção era eu soltar a bola. O Mourinho gostava de futebol de posse e a verdade é que eu ficava muito tempo agarrado à bola», lembrou o antigo internacional luso.
Os caminhos de José Mourinho e César Peixoto separam-se no final dessa época, com o técnico a rumar à Premier League e a conquistar ainda mais admiradores do seu trabalho pelo mundo.
O resto é história.
Para o canhoto, as limitações físicas continuaram, mas a mudança de hábitos, inteligência e maior profissionalismo ainda levaram César a realizar uma carreira de valor, com passagens, por exemplo, por SC Braga e SL Benfica.
O destino ditou um reencontro entre ambos esta sexta-feira. Se Mourinho vive os primeiros passos do regresso a Portugal, Peixoto está, provavelmente, na melhor fase do seu percurso nos bancos, com um projeto sólido em Barcelos.
«Com 20, 21 anos, não posso dizer que aprendi taticamente com o Mourinho naquela fase. Contudo, reparo agora em muitas coisas que bebi dele, especialmente na forma como faço a gestão dos grupos de trabalho. Ele conseguia que todos se sentissem importantes», disse o treinador gilista no programa Ponto Final.
«Lembro-me que ele marcou um jogo com a equipa B no primeiro dia de um ano civil, para os jogadores com menos minutos terem ritmo. Colocou uma câmara a gravar a sessão e eu, de calças, a brincar com a situação. Tinha a mania que era craque.»
«Dias mais tarde, o mister entrega-me um DVD e pede para eu ver. Tinha aspetos negativos e positivos meus naquele treino. Ele só filmou as minhas ações com a intenção de mexer comigo, especialmente o meu comportamento sem bola.»
«A gravação, naquela altura, não era prática comum. Hoje em dia tenho o cuidado de filmar ações individuais dos jogadores, seja para os elogiar ou dar na cabeça. É uma boa forma de chegar até eles», destacou César, desafiado a comentar a influência de Mourinho na sua forma de treinar.
Competitivos, os abraços e euforias devem estar guardados para o apito final na Luz.
Arriscamos escrever, porém, que Mourinho é um professor orgulhoso, ainda por cima de um aluno que deu algum trabalho.
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