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Central do Timão

·8 juin 2025

Gestão afastada do Corinthians sabia sobre débitos alvos de polêmica da reabertura de contas desde 2024

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  1. Por Daniel Keppler / Redação da Central do Timão

Desde que o Conselho Deliberativo (CD) do Corinthians reprovou, no último dia 28 de abril, o balanço de 2024 do clube, os bastidores do Parque São Jorge vem debatendo uma polêmica sobre o tema: o pedido da gestão Augusto Melo para que um total de R$ 191,2 milhões em débitos, declarados nas contas, sejam atribuídos a 2023, através da reabertura e reapresentação dos demonstrativos financeiros deste ano.

A diretoria justificava o pedido sustentando que tais valores seriam relativos a questões com fato gerador em 2023, que não teriam sido corretamente declarados. Em vários momentos, ainda, membros da diretoria financeira do presidente afastado garantiram que apenas no final de março a situação havia sido descoberta, e por isso o pedido de reabertura não foi feito antes da apresentação do balanço, cujo documento apresentou déficit de R$ 181,7 milhões.


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Foto: Divulgação / Corinthians

O valor ficou muito aquém do previsto em orçamento, onde a gestão estimava superávit de R$ 17,6 milhões. A diferença foi um dos motivos para que os conselhos Fiscal (CF) e de Orientação (CORI) do clube recomendassem a rejeição das contas. Ambos os órgãos receberam os documentos com atraso, inclusive, justificado pela direção à época com o discurso de que as contingências em questão, que deveriam ser atribuídas a 2023, haviam sido recém-descobertas.

No entanto, documentos recebidos pela Central do Timão, aliados à consulta de declarações emitidas pelo próprio Corinthians ao longo de 2024, mostram que a diretoria sabia há vários meses sobre os fatos relacionados a estas contingências. Mais que isso: alguns destes fatos foram inclusive discutidos com o Conselho Fiscal, no ano passado, sem que o departamento financeiro apontasse, em momento algum, a necessidade de reabrir algum balanço anterior por conta dos mesmos.

Para facilitar o entendimento, a matéria explicará separadamente cada débito que compõe os R$ 191,2 milhões. Será explicado, caso a caso, a origem da contingência; o motivo de a gestão Augusto Melo defender que a mesma seja repassada às contas do ano anterior; e o que o departamento financeiro do clube falava sobre o assunto antes de março deste ano, quando a pressão para que as contas fossem fechadas a tempo de cumprir o prazo legal se intensificou sobre a diretoria.

Parcelamento de ISS sobre bilheteria

Do valor total do débito, cerca de R$ 76 milhões são relativos a multa e juros do ISS (Imposto sobre Serviços) de bilheteria. Segundo a última versão sustentada pelo financeiro da gestão afastada, o valor deve ser incluído nas contas de 2023 do Alvinegro pois um despacho do Conselho Municipal de Tributos da Prefeitura de São Paulo havia negado, em junho daquele ano, um recurso do clube para reconsiderar a cobrança.

Seu valor original, inclusive, era maior: R$ 141 milhões. No entanto, o Corinthians celebrou acordo em junho de 2024 para parcelar a dívida em 120 meses, reduzindo o montante. Este acordo foi feito no âmbito de uma campanha promovida pela Prefeitura (“Transação de Débitos Municipais”), ocorrida entre 8 de dezembro de 2023 e 30 de junho de 2024. O clube aderiu dois dias antes do prazo expirar.

A data de celebração do acordo com a Prefeitura já evidencia, por si só, que a gestão Augusto Melo tinha ciência deste débito dez meses antes da apresentação das contas de 2024. Mas este tema, porém, já havia sido alvo de posicionamento da diretoria em setembro passado, quando uma polêmica envolvendo o Dia da Transparência gerou um princípio de crise política nos bastidores do clube.

Na ocasião, o então diretor Pedro Silveira apresentou um valor atualizado para a dívida corinthiana, afirmando que havia descoberto um “erro fiscal” de R$ 220 milhões. Porém, em reunião posterior no CORI, Silveira não conseguiu justificar o número, pedindo desculpas e declarando que, na verdade o valor correto era de R$ 106 milhões – incluindo aí, justamente, os R$ 76 milhões do acordo de ISS com a Prefeitura.

Dias depois, o Corinthians divulgou nota explicando a confusão e revelando uma importante informação: que a não-apresentação da dívida de ISS no balanço de 2023 estava embasada em parecer de uma assessoria especializada, que orientou o clube a não contabilizar o valor no balanço por considerar que o risco de execução da dívida era apenas “possível” – nestes casos, segundo as normas, não é necessário provisionar valores para o débito nos demonstrativos financeiros.

Esta mesma assessoria foi a responsável por modificar sua orientação em 2024, reclassificando o risco de execução para “provável” e motivando o clube a celebrar o acordo com a Prefeitura. No entendimento de profissionais da área contábil ouvidas pela Central do Timão, o fato de a reclassificação ter ocorrido em 2024, mesmo ano da celebração do acordo, justificaria a inclusão desta provisão no balanço deste ano, e não do anterior.

O assunto também foi discutido em reunião do Conselho Fiscal em 24 de outubro do ano passado. Na ata, à qual a Central do Timão teve acesso, é possível verificar que o financeiro do clube reiterou as afirmações que havia feito antes em nota oficial e ao CORI. Em nenhum destes posicionamentos a gestão fez qualquer menção à necessidade de reabrir as contas de 2023 por conta do ISS devido. A medida passou a ser defendida, publicamente, apenas a partir de abril deste ano.

Vale citar, por fim, que o parecer do professor Eliseu Martins, contratado pelo Corinthians para justificar o pedido de reabertura, não incluiu uma análise desta questão. A redação questionou o clube em maio deste ano sobre porque não foi pedida a opinião do especialista sobre o ISS. O financeiro corinthiano apenas afirmou que outros documentos sustentariam a opinião da gestão, sem explicar quais.

Contingências prováveis de 2023

Outros R$ 56,2 milhões do total do débito são referentes a provisões sobre processos judiciais com classificação de “perda provável” relativas a exercícios anteriores, que segundo a gestão afastada não haviam sido contabilizadas corretamente. Segundo as normas contábeis, é obrigação de uma empresa “reservar” (ou seja, provisionar) um valor no balanço compatível com os valores das causas que tem chance provável de perder.

Desde abril deste ano, a gestão afastada sustentava que diversos processos com esta classificação de “perda provável” tiveram o status ignorado pela diretoria anterior, gerando essa lacuna no provisionamento – algo que teria sido descoberto apenas durante o fechamento das contas de 2024, conforme citado pelos membros do financeiro em maio, durante encontro com jornalistas no CT Joaquim Grava.

No entanto, uma análise destas provisões já havia sido feita antes. Em ata de reunião do Conselho Fiscal datada de 24 abril de 2024, à qual a Central do Timão teve acesso, cuja pauta era exatamente a análise do balanço de 2023 do Corinthians, o assunto “contingências” é debatido, mas de maneira bastante diversa do que é defendido atualmente pela gestão afastada.

No texto da ata, o CF aponta uma “diminuição nos valores contingenciados”, mas declara que, após a análise dos relatórios de circularização enviados pelos escritórios de advocacia responsáveis pelas causas cíveis e trabalhistas movidas contra o Corinthians, verificou-se o clube respeitou, no balanço de 2023, as classificações de “risco provável” apresentadas nos documentos.

O CF também apontou, por outro lado, casos pontuais onde a ação já tinha “elementos suficientes para uma provisão de perda”, mas o campo de valores a serem provisionados estava zerado – no entanto, o valor somado destes casos seria muito menor que os R$ 56,2 milhões denunciados posteriormente pela gestão afastada.

A ata mostra ainda que o próprio financeiro da gestão Augusto Melo se manifestou sobre estas “distorções”, explicando dois casos específicos. Em um deles, argumentou que a perda provável apresentada pelos advogados eram relativos a casos de FGTS e não repasse de tributos, cujas provisões já constariam no balanço “nas rubricas adequadas”. Em outro, sustentou que o valor apontado como perda provável pelos advogados referia-se a processo de crédito (portanto, um ativo) e deveria ser desconsiderado.

A gestão ainda finalizou sua manifestação, à época, defendendo que a ocorrência de tais distorções “não seria motivo, por si só, de reprovação das contas, apenas um alerta para a instituição manter um controle interno mais rígido e questionar os advogados responsáveis pelas causas”. O valor de R$ 56,2 milhões para estas contingências e a defesa de que elas devem ser repassadas ao balanço de 2023 passou a ser feita, publicamente, apenas a partir de abril deste ano.

Ao contrário do ISS, estas contingências foram alvo de análise de Eliseu Martins, que, baseado nas informações fornecidas pela gestão afastada, concluiu que o valor deve constar no balanço de 2023 do Corinthians através de uma reapresentação. R$ 39 milhões seriam relativos a contingências tributárias e outros R$ 17 milhões relativos a contingências desportivas.

Contingências de dívidas passadas

Ainda no tema “contingências”, o débito apresenta R$ 28,8 milhões que se diferem um pouco das citadas anteriormente. Isso pois esse valor é explicado pela gestão afastada de maneiras diferentes, tendo sido categorizado no balanço de 2024 em três tipos: atualização monetária, novos processos e reclassificação de risco.

No primeiro caso, a gestão afastada defende que há processos contra o clube, motivados por fatos anteriores a 2024, onde a “perda provável” já foi reconhecida, cujas provisões devem ser ajustadas em R$ 4,2 milhões devido a atualização monetária. Já o segundo caso tem relação com novos processos, cujos valores somam R$ 2,9 milhões, que mesmo tendo sido iniciados apenas em 2024 deveriam ter suas provisões apontadas no balanço anterior pois seriam relativos a “passivos de exercícios anteriores”.

Por fim, o terceiro caso trata de processos que, em 2023, estavam classificados como “perda possível” e que em 2024 foram reclassificados nos relatórios de circularização para “perda provável”, gerando a obrigação de provisionar R$ 21,7 milhões nas contas do Corinthians. No entanto, a gestão afastada defende que, pelos processos terem fatos geradores anteriores a 2024, esta provisão deveria ser feita no balanço do ano anterior.

Chama atenção que, embora todos estes casos também se refiram a contingências, eles não constam no parecer do professor Eliseu Martins. Em outras palavras, a gestão Augusto Melo optou por não pedir a opinião do especialista para estes valores. Profissionais da área contábil ouvidos pela Central do Timão opinaram que as três provisões presentes nesta categoria foram geradas por eventos ocorridos no exercício de 2024 e, portanto, deveriam constar neste balanço, e não no de 2023.

Apropriação de juros Profut

Por fim, o débito apresenta também R$ 30,2 milhões que, segundo a gestão afastada, se referem a uma diferença na contabilização da dívida do Corinthians junto ao Programa de Modernização da Gestão e de Responsabilidade Fiscal do Futebol Brasileiro (Profut). Segundo a tese levantada, o valor devido pelo clube neste programa foi declarado a menor no balanço 2023, gerando esta diferença.

Esta diferença teria sido detectada durante o fechamento do balanço de 2024, ao checar o saldo devedor do Corinthians no Profut por meio de extratos obtidos junto à Receita Federal. O timing para tal descoberta chama atenção, devido ao fato de que nenhum apontamento sobre esta discrepância é feito na reunião do Conselho Fiscal de abril de 2024, que analisou as contas do ano anterior e cuja ata já foi mencionada nesta matéria,

No encontro, inclusive, o órgão cita por mais de uma vez um documento emitido pela própria Receita Federal chamado “Relatório de Situação Fiscal”, datado de 17 de abril do ano passado, a partir do qual se atestou que o Corinthians estava cumprindo suas obrigações fiscais e não havia rescindido nenhum acordo por falta de pagamento.

No balanço apresentado pelo Corinthians em 2023, a dívida declarada junto ao Profut foi de R$ 102,6 milhões (uma redução em relação ao ano anterior, quando o valor declarado foi de R$ 109,2 milhões). Já nas contas entregues em 2024, a mesma rubrica foi registrada com o valor de R$ 130,3 milhões. O relatório não menciona, no entanto, a data efetiva em que a discrepância de valores teria sido descoberta.

Este valor também foi alvo de análise de Eliseu Martins no parecer entregue ao Corinthians. No documento, o professor conclui, após verificar a documentação que a gestão afastada lhe enviou sobre o tema, que os valores deveriam ser atribuídos ao balanço de 2023. Ele completou a opinião declarando: “E nos informa ainda o SCCP que nenhuma documentação justifica eventuais razões de eventual justificativa da diferença entre saldos contábeis do SCCP e extratos da Receita Federal”.

Falta de transparência atrapalhou

A gestão afastada manteve relações conturbadas com os órgãos fiscalizadores do Corinthians enquanto esteve no poder. As principais reclamações dos conselhos em geral, tanto CORI e CF quanto o Conselho Deliberativo (CD) diziam respeito à não resposta de questionamentos e também à não entrega de documentos essenciais para a fiscalização dos trabalhos da diretoria.

Entre estes documentos, estão presentes os balancetes mensais e trimestrais, cuja entrega é obrigatória, segundo o estatuto do Corinthians. Em apuração da Central do Timão junto ao CORI, verificou-se que apenas os balancetes relativos a janeiro, fevereiro e março de 2024 foram entregues de forma regular, ou seja, na data correta.

A partir de então, os balancetes mensais pararam de ser apresentados e as contas do segundo trimestre foram entregues apenas em outubro para o CF e novembro para o CORI. No entanto, até mesmo esta apresentação foi feita sem uma série de documentos comprobatórios dos gastos realizados, culminando em um pedido de impeachment de Augusto Melo, que ainda tramita internamente.

A falta de transparência da diretoria afastada neste quesito pode ter causado, em parte, as diversas mudanças de visão da gestão sobre os débitos que, atualmente, o grupo defende que devem ser repassados às contas de 2023. Em maio, por exemplo, a Central do Timão questionou o financeiro sobre porque questões como o ISS, por exemplo, não constou em uma revisão do orçamento de 2024 (que jamais foi feita, embora o estatuto determine). Não foi dada uma resposta objetiva.

Compasso de espera

Após o afastamento cautelar de Augusto Melo, em 26 de maio, pelo CD, uma diretoria interina assumiu o comando do Corinthians, e todos os diretores estatutários nomeados pelo presidente anterior foram considerados demissionários. Com isso, o financeiro alvinegro passou por uma transição, na qual o ex-diretor Rozallah Santoro colaborou pontualmente, sob demanda.

Posteriormente, o clube confirmou o retorno de Emerson Piovesan ao cargo de diretor, que já havia sido ocupado pelo mesmo entre 2015 e 2017. Além disso, Roberto Gavioli, que atuou no financeiro alvinegro por vários anos como gerente, até pedir para sair em junho do ano passado, também tem sua volta dada como certa, embora o Alvinegro não tenha confirmado oficialmente.

Em meio a esta transição, não se sabe se o departamento financeiro dará sequência ao pedido para reabertura das contas de 2023 do Corinthians. Em 21 de maio, o Conselho Fiscal havia se comprometido a proceder com a reanálise deste balanço, caso recebesse evidências das irregularidades. Na última quinta-feira, 5, membros do órgão receberam e-mail de Luiz Ricardo Alves, o “Seedorf”, com documentos que provariam a tese que defende a reabertura.

Caberá agora ao Conselho Fiscal, após análise do conteúdo, dar seu parecer sobre o tema, para que o pedido de reabertura, se mantido, avance pelos outros órgãos fiscalizadores e seja votado no Conselho Deliberativo, etapa que a própria gestão afastada via como essencial, conforme admitido publicamente durante a conversa com jornalistas no CT Joaquim Grava em maio.

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