Calciopédia
·19 de junho de 2020
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Não há quem possa negar que Francisco Govinho Lima teve uma carreira movimentada, cheia de bons momentos, intempéries e frequentes mudanças de clube. O discreto ex-volante amazonense é lembrado no Brasil pela sua passagem conturbada pelo São Paulo, quando foi inscrito irregularmente na Copa do Brasil, o que causou a eliminação do tricolor paulista da competição. Apesar da péssima lembrança no território brasileiro, Lima fez história na Rússia e, sobretudo, na Itália, país em que viveu o ápice de sua trajetória.
Nascido em 1971 na cidade de Manaus, capital do Amazonas, Lima começou a sua carreira no Nordeste. O volante se mudou para o Ceará e, por lá, conquistou o seu primeiro título como jogador profissional: o de campeão estadual pelo Ferroviário. Depois de ser emprestado para o Sul América, time manauara, Lima deu o primeiro grande passo na sua carreira ao se transferir para o São Paulo de Telê Santana. No tricolor paulista foram apenas duas temporadas, com participação irrelevante no título da Copa Conmebol e o incidente da Copa do Brasil.
Apesar de não ter feito muito sucesso no time de Telê, Lima passou algum tempo emprestado a União São João e Nacional-AM, e chamou a atenção do Gaziantepspor, da primeira divisão da Turquia. Seria o começo de uma bem sucedida trajetória na Europa. Após dois anos ajudando o clube instalado próximo à fronteira com a Síria a permanecer na elite turca, o manauara foi comprado pelo Zürich, da Suíça. E foi pelo FCZ que foi notado pelo futebol italiano.
Na temporada 1998-99, o Zürich surpreendeu ao alcançar as oitavas de final da Copa Uefa, eliminando Shakhtar Donetsk e Celtic no caminho. O atacante sul-africano Shaun Bartlett era o destaque da equipe, mas Lima dava o vigor necessário no meio-campo, de forma discreta, mas eficiente. Nas oitavas, os suíços ficaram perto de eliminar a Roma: o placar agregado foi de 3 a 2 para os italianos, com gols de Francesco Totti nos acréscimos tanto na partida de ida quanto na de volta.
Lima saiu do duelo valorizado – e os sete gols em 32 partidas do Campeonato Suíço ratificaram seu status de meio-campista faz-tudo. Dessa forma, o amazonense chegou ao país que lhe daria a maior projeção da sua carreira no verão de 1999, quando foi adquirido pelo Lecce, aos 28 anos. O time giallorosso estava sendo um verdadeiro ioiô do futebol italiano no fim da década de 1990, mas o volante contribuiu para que essa história cessasse por uma temporada.
Em 1999-2000, o Lecce evitou o rebaixamento por quatro pontos e ficou na 13ª colocação. Lima ganhou a camisa 10 dos apulianos, foi titular absoluto da equipe, disputou 32 das 34 rodadas da Serie A, e se consolidou como um dos pilares defensivos da equipe, ao lado do zagueiro Juarez, também brasileiro, e do goleiro Antonio Chimenti – na frente, Cristiano Lucarelli marcava os gols dos lupi. Francisco se destacou ainda pela forte marcação sobre Zinédine Zidane na vitória por 2 a 0 sobre a Juventus, na quarta rodada, e pelo gol de cabeça anotado naquela mesma peleja.
Pela ótima temporada em Lecce, o volante brasileiro chamou a atenção do Bologna, que vinha em grande momento – em 1999, fora semifinalista da Copa Uefa e da Coppa Italia. Lima chegou para substituir o sueco Klas Ingesson, ídolo da torcida rossoblù, e manteve a mesma pegada dada pelo gigante, possibilitando que Julio Cruz e Giuseppe Signori pudessem brilhar mais no ataque. Os veltri terminaram a Serie A na 10ª colocação e o amazonense novamente mudou de clube. E que mudança.
A regularidade de Lima chamara a atenção de Fabio Capello, consagrado como campeão italiano com a Roma – ex-meia central, o sisudo comandante sabia avaliar bem um jogador da posição. O treinador apostou no esforçado volante que vinha da Emília-Romanha para ser titular no estrelado elenco giallorosso, que também estava recheado de brasileiros. Ao lado de Antônio Carlos, Aldair, Emerson, Cafu e Marcos Assunção, Lima seria mais um canarinho na Cidade Eterna.
A sua chegada mudou o meio-campo romanista, uma vez que a dupla de volantes da época era formada por Damiano Tommasi e Cristiano Zanetti. O segundo se transferiu para a Inter e, no decorrer da temporada 2001-02 (depois de Francisco vencer a Supercopa Italiana como opção de banco), Capello decidiu montar um trio no setor.
Tommasi e Emerson eram titulares absolutos, enquanto o manauara de 30 anos mostrou personalidade, ganhou a disputa com Assunção e foi o segundo meio-campista com mais jogos pela equipe da capital – 42, quatro a menos que Damiano. Lima, o novo queridinho de Capello, foi fundamental para que a Roma disputasse o título novamente. O bicampeonato consecutivo não veio por um ponto, mas ao menos a equipe foi vice-campeã nacional.
No verão de 2002, Assunção rumou ao Betis e Lima se consolidou ainda mais no meio-campo da Loba. Capello entregou ao amazonense as chaves do meio-campo e o camisa 5 manteve sua dureza no setor, destruindo as jogadas dos adversários sem se importar com grife. Francisco poderia ser o patinho feito daquele time, mas era peça fundamental para a engrenagem funcionar e colaborou para que os giallorossi tivessem uma defesa fortíssima, com Walter Samuel como destaque: quando foi novamente vice-campeã italiana, em 2004, a Roma sofreu apenas 19 gols e teve a zaga menos vazada do país. No ano anterior, a equipe também foi segunda colocada da Coppa Italia.
Depois de três temporadas em alto nível, Lima só se transferiu da Roma porque Capello foi treinar a Juventus e ele não se encaixava no modelo de Cesare Prandelli, seu sucessor. Aos 33 anos, depois de 131 partidas (e nenhum gol) pela equipe capitolina, o volante foi receber um alto salário no futebol russo. Francisco ainda fez a Loba ganhar um bom dinheiro ao ser negociado com o Lokomotiv Moscou por 5,7 milhões de euros – um alto montante para sua idade.
Lima defendeu o Lokomotiv por duas temporadas e conquistou três títulos na Rússia, com destaque para a Premier League local. Em 2006, então, o amazonense iniciou uma peregrinação: se mudou para o Catar; voltou para a terra da vodca no mesmo ano, dessa vez para defender o Dinamo Moscou; e, depois, foi a vez de retornar para a Itália. No Brescia, seu quarto clube italiano, o volante disputou mais uma temporada e meia, nas quais os andorinhas brigaram pelo acesso à Serie A. Contudo, a equipe da Lombardia não passou dos playoffs e teve de continuar na segundona.
Já com 37 anos, o brasileiro fez um caminho natural para jogadores com idade avançada naquele período: ir para a Major League Soccer. Lima teve uma experiência com a camisa do San José Earthquakes e intensificou suas andanças pelo mundo: em 2009 voltou à Itália – mais precisamente, à Apúlia – para atuar por Taranto e pelo amador Racale, e, em 2010, reencontrou a Amazônia. Com 39 anos e uma imensa bagagem nas costas, Pifó, como era conhecido no começo da carreira, defendeu novamente o Nacional, além de Rio Negro, e São Raimundo, quando pendurou as chuteiras pela primeira vez, aos 40 anos.
Lima continuou no futebol na qualidade de diretor esportivo do Nacional, mas foi convencido a trocar a função executiva pelo retorno aos gramados em 2016, quando defendeu brevemente o Fast Clube na Copa Verde. Daí para rumar à Apúlia novamente foi um pulo: os minúsculos Otranto e Atletico Aradeo lhe abrigaram até que, aos 47 anos, pendurou as chuteiras pela segunda e última vez. Na Itália, Francisco ainda conseguiu uma licença de treinador pela Uefa, que lhe permitia treinar times da quarta divisão. Atualmente, o ex-jogador utiliza o conhecimento adquirido na vida e nos cursos da entidade para atuar como avaliador de futebol em Manaus.
Apesar de estar morando no coração da Amazônia, bem longe da Itália, Lima é lembrado até hoje pela torcida do time que defendeu de 2001 a 2004. Volta e meia, Pifó faz parte do elenco do Roma Legends, que disputa torneios amistosos beneficentes pelo mundo. O manaura chegou sob olhares tortos, comeu pelas beiradas e, sem dúvidas, saiu como vitorioso.
Francisco Govinho Lima Nascimento: 17 de abril de 1971, em Manaus (AM) Posição: volante Clubes: Ferroviário (1990-1993 e 1994), Sul América (1993), São Paulo (1994 e 1996), União São João (1995), Nacional-AM (1996 e 2010), Gaziantepspor (1996-1998), Zurique (1998-1999), Lecce (1999-2000), Bologna (2000-2001), Roma (2001-2004), Lokomotiv Moscou (2004-2006), Qatar SC (2006), Dinamo Moscou (2006), Brescia (2007-2008), San José Earthquakes (2008), Taranto (2009), Racale (2009-10), Rio Negro (2010), São Raimundo (2011), Fast Clube (2016), Otranto (2016) e Atletico Aradeo (2017). Títulos: Campeonato Cearense (1994), Copa Conmebol (1994), Supercopa Italiana (2001), Premier League Russa (2004), Supercopa da Rússia (2005) e Copa da Comunidade dos Estados Independentes (2005).
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