Calciopédia
·05 de junho de 2020
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A história do futebol está repleta de jogadores habilidosos que não produziram o quanto seu talento permitia. Por essa razão, eles tiveram um reconhecimento inferior ao projetado por especialistas no momento em que surgiram. Massimiliano Allegri foi um dos que tiveram de conviver com esse destino: hoje gabaritado como treinador, o toscano não decolou nos gramados por questões ligadas à sua personalidade e só teve passagem razoável por clubes pequenos e médios.
Allegri nasceu em Livorno e, como muitos de seus concidadãos, tem sangue proletário: sua mãe era enfermeira e seu pai trabalhava como estivador no movimentado complexo portuário da cidade. Durante sua infância e sua adolescência, Max jogou futebol apenas de forma amadora, seja nos campeonatos dos colégios salesianos ou nos sindicais do porto. Só aos 17 anos é que acertou com o Cuoiopelli, equipe de sua região que disputava a quinta categoria nacional.
Todo o percurso inicial da carreira de Allegri se deu em solo toscano. Após a experiência no Cuoiopelli, o meio-campista disputou três temporadas de Serie C1 pelo Livorno. No time de sua cidade, por seu físico esguio e habilidade de se desvencilhar dos marcadores, ganhou do técnico Rossano Giampaglia o apelido de Acciuga – anchova, em português, numa referência à espécie de peixe bastante comum no litoral livornês. Em 1988, Allegri chamou a atenção do Pisa, então na elite. Max até estreou na Serie A pelos nerazzurri, mas só fez duas partidas (totalizando nove minutos) e voltou ao Livorno, que já estava na quarta divisão.
Em sua segunda passagem pelos amaranto, com 22 anos, Allegri teve seu primeiro momento de destaque na carreira e terminou a temporada com oito gols marcados. Ali, Max se revelou como um meio-campista de características ofensivas, que poderia jogar ou como um central que vinha de trás, atacando os espaços, ou como trequartista, por conta de sua técnica e da precisão nas finalizações. O toscano também sabia interpretar as fases do jogo e se sacrificava para ajudar os companheiros na marcação.
Com essas qualidades, Massimiliano galgou degraus na sua carreira nos anos subsequentes. Passou pelo Pavia, da terceira divisão, e em 1991 já estava no Pescara, que lutava para retornar à Serie A. No principal time dos Abruzos, Allegri encontrou aquele que seria o seu mentor: Giovanni Galeone.
Inicialmente, o técnico ficou confuso pela chegada de um meia que não conhecia para reforçar um elenco que já estava fechado. Mas, conforme confessou em uma entrevista dada à Goal, em 2015, logo mudou de ideia. “Depois de três dias, tudo estava claro para mim. Ele era um grande jogador e um garoto sério e respeitoso, que chegou com humildade e, após pouco tempo, já era líder do vestiário”, disse.
Max Allegri se consolidou como titular no ofensivo time de Galeone e foi uma das peças mais importantes para o vice-campeonato da Serie B 1991-92, que valeu o acesso à elite para os delfini. Na primeira divisão, o toscano apareceu de uma vez para o cenário nacional como um dos maiores destaques do Pescara, ao lado de Dunga, Stefano Borgonovo e Blaz Sliskovic. O meia foi o cobrador oficial de pênaltis da equipe biancazzurra e também se notabilizou por chutes de média distância, que o fizeram artilheiro dos golfinhos, com 12 gols – alguns deles contra adversários importantes, como Milan, Juventus, Roma, Sampdoria e Lazio.
Allegri acabou sendo a cara de uma equipe que se notabilizou por placares “bailarinos”. De um lado, sofreu derrotas por 5 a 4 (Milan), 5 a 3 (Ancona), 5 a 2 (Udinese), 4 a 3 (Genoa), 4 a 2 (Foggia), 4 a 1 (Inter) e 4 a 0 (Milan e Cagliari); de outro, teve triunfos por 4 a 3 (Ancona), 3 a 0 (Napoli) e 5 a 1 (Juventus). O Pescara foi rebaixado como dono da pior defesa da Serie A e lanterna do torneio, mas também teve o sétimo ataque mais positivo da competição.
Esse tipo de gangorra era comum na vida de Max: lhe faltava equilíbrio como pessoa. Ao mesmo tempo em que conseguia ser um líder, por vezes apresentava um comportamento errático e pouco interessado, que se estendia à sua vida pessoal – em 1992, por exemplo, Allegri virou alvo de revistas de fofoca por ter rompido com sua noiva dois dias antes do casamento. Já transformado em treinador, o toscano comentou sobre o seu passado como atleta. “Acabei sendo um jogador medíocre. Talvez pudesse ter defendido a seleção se já tivesse a mentalidade que tenho atualmente”, afirmou ao Corriere dello Sport, em 2015.
Apesar de não oferecer garantias de que poderia brilhar, por conta de sua irregularidade, Acciuga permaneceu na Serie A – e dessa vez teve chance num time da parte alta da tabela. O Cagliari comandado por Gianfranco Matteoli, Luís Oliveira e Francesco Moriero foi sexto colocado em 1992-93 e ganhou vaga na Copa Uefa. Sem Enzo Francescoli e Massimiliano Cappioli, vendidos a Torino e Roma, o clube sardo buscou Julio César Dely Valdés e o próprio Allegri.
Max passou pouco mais de duas temporadas na Sardenha, mas nunca conseguiu se firmar como titular. Foi um reserva útil tanto para o técnico Bruno Giorgi quanto para Óscar Tabárez, seu sucessor, e contribuiu com campanhas razoáveis na elite (12º e 9º lugares, respectivamente) e uma façanha na Copa Uefa: o Cagliari só caiu nas semifinais para a Inter, campeã da edição 1993-94. Allegri anotou uma vez nessa trajetória, contra o Mechelen, e terminou sua passagem pela ilha com cinco tentos.
Em 1995, o meia toscano reencontrou Galeone. Recém-chegado ao Perugia, na Serie B, o técnico pediu a contratação de Allegri na janela de outono e o efetivou como motorzinho do seu time. Max fez ótima dupla com Federico Giunti no meio-campo, fornecendo o suporte necessário ao goleador Marco Negri. Os grifoni haviam começado mal na segundona, mas reagiram e garantiram o acesso. Com sete gols em 26 aparições, Acciuga foi o segundo artilheiro da equipe, atrás apenas de Negri (18).
Novamente na elite, Allegri foi titular absoluto do Perugia com Galeone, ao longo do primeiro turno do campeonato. Contudo, o treinador foi demitido após a 14ª rodada e Max acabou liberado por Nevio Scala, seu substituto. O toscano não participou do restante da campanha que culminou no rebaixamento umbro porque já estava na Serie B, defendendo o Padova. Lá permaneceu, sem destaque, até ser “convocado” por seu mentor mais uma vez.
O treinador chegara ao Napoli no fim de 1997 para tentar salvá-lo do rebaixamento e confiou no pupilo, já com 30 anos, para comandar o meio-campo. Contudo, Allegri só atuou em sete partidas: Galeone foi demitido pouco depois de sua contratação e Vincenzo Montefusco, seu sucessor, não contava com seu futebol. Assim, o toscano atuou na Serie A pela última vez em 8 de fevereiro de 1998 e, mesmo assim, acumulou o terceiro descenso de sua carreira. Acciuga teve sete temporadas na elite, nas quais defendeu cinco clubes e marcou 19 gols.
Já na fase descendente da carreira, Massimiliano voltou ao Pescara e disputou pelos golfinhos duas temporadas de Serie B – na última delas, trabalhou novamente com Galeone. Em 2000, Allegri se transferiu para mais perto de sua cidade natal e, na Toscana, defendeu a Pistoiese pela segundona. O jogador chegou a ser acusado de tentativa de manipulação de resultados e foi suspenso preventivamente por um ano, mas todo o processo acabou anulado pela comissão disciplinar da FIGC, a federação italiana, e Max foi absolvido.
Nos dois anos derradeiros de sua trajetória como jogador, Allegri defendeu a Aglianese, com a qual subiu para a quarta divisão e teve uma campanha razoável na Serie C2 de 2002-03. No próprio clube da província de Pistoia, Massimiliano iniciou sua carreira como técnico logo após pendurar as chuteiras. Em sua nova ocupação, colocou em prática a mentalidade ofensiva de Galeone, que o inspirou ao longo dos anos.
Depois da Aglianese, Max Allegri treinou Spal e Grosseto até reencontrar Galeone na Udinese: no clube friulano, foi auxiliar do seu mentor durante quase toda a temporada 2006-07. Na sequência, o toscano passou rapidamente pelo Lecco e entrou numa curva ascendente que persiste até os dias de hoje. A primeira parte do caminho, mais modesta, teve um título da Serie C1 pelo Sassuolo e sua estreia na Serie A com um surpreendente Cagliari, que encantou a Itália com esquemas ofensivos e ousados.
O bom futebol que Allegri coordenou em sua segunda passagem pela Sardenha o levou ao Milan, clube pelo qual foi campeão italiano logo no primeiro ano de trabalho. Max foi afetado pela crise rossonera e recebeu muitas críticas nos anos seguintes, mas recuperou a credibilidade de forma magistral, à frente da Juventus. Pela Velha Senhora, marcou época: foi pentacampeão italiano, conquistou quatro vezes a Coppa Italia e duas Supercopas Italianas, além de ter sido vice europeu em duas ocasiões. Aos 52 anos, ainda tem muita lenha para queimar e tempo de sobra para erguer taças e mais taças.
Massimiliano Allegri Nascimento: 11 de agosto de 1967, em Livorno, Itália Posição: meio-campista Clubes: Cuoiopelli (1984-85), Livorno (1985-88 e 1989-90), Pisa (1988-89), Pavia (1990-91), Pescara (1991-93 e 1998-2000), Cagliari (1993-95), Perugia (1995-97), Padova (1997), Napoli (1997-98), Pistoiese (2000-01) e Aglianese (2001-03) Títulos: Coppa Italia da Serie C (1987) e Serie D (2002)