Trivela
·09 de dezembro de 2022
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·09 de dezembro de 2022
A Croácia perdeu para a França na final da última Copa do Mundo. O ápice da geração liderada por Luka Modric. Superou os feitos do time de 1998, que havia estreado na competição surpreendendo a todos. Nomes importantes como Ivan Rakitic e Mario Mandzukic deixaram a seleção. A vice-campeã sofreu derrotas pesadas, como um 6 a 0 para a Espanha. Perdeu da Hungria. Foi goleada por Portugal. A percepção era que o gás havia acabado. Havia deixado tudo nos campos russos, e um time agora envelhecido não conseguiria competir tão bem no novo ciclo. Essa impressão começou a ser deixada de lado na Eurocopa, mas seria aquele o último suspiro de um time campeão? Não. A Croácia segue em frente, mais uma vez demonstrando coração, raça e brio de um time especial que se recusa a morrer – além da qualidade absurda de alguns de seus jogadores.
Dizer que o ponto forte da Croácia é seu meio-campo é que nem dizer que a principal arma do Thor é o seu martelo. Óbvio. É o setor que conta com Luka Modric, capaz de, aos 37 anos, aos 117 minutos de jogo, girar em cima de Casemiro, um dos melhores jogadores da Copa do Mundo, e iniciar o contra-ataque que empatou o jogo contra o Brasil. Ao seu lado, estão os excelentes Mateo Kovacic e Marcelo Brozovic, tão técnicos quanto inteligentes. Mas o que realmente impressiona nesse time é a parte mental: eles simplesmente não desistem.
A Croácia encarou momentos diferentes nas quartas de final. Teve domínio no primeiro tempo e não conseguiu criar. Sofreu com a pressão inicial do Brasil depois do intervalo e contou com o gigante Dominik Livakovic. Experiente, tentou manter a posse de bola para frear a empolgação e conseguiu até certo ponto. Levou à prorrogação, na qual entrou no modo sobrevivência. Estava apenas se segurando até Neymar encaixar uma linda jogada para abrir o placar. Nem o gol tão tarde quebrou o espírito dos croatas que seguiram concentrados, esperando aquela chance, aquela bola que a excepcional defesa do Brasil se recusava a entregar. Até que entregou.
A três minutos do fim, o Brasil pressionou no campo de ataque, quando não precisava. Casemiro não fez a falta em cima de Modric, e a Croácia conseguiu encaixar um inesperado contra-ataque, no qual também contou com a sorte: um desvio em Marquinhos que matou Alisson na jogada. Foi a única finalização ao alvo dos europeus em toda a partida. Bem na hora certa para forçar os pênaltis e o momento psicológico pender a seu favor. Era tudo que um time tão cascudo precisava para ser perfeito da marca do cal e esperar os erros do adversário.
Não foi sempre assim? Desde a Copa do Mundo de 2018, a Croácia disputou sete jogos de mata-mata. Seis deles foram para a prorrogação. Quatro foram decididos nos pênaltis, sempre a seu favor. É um time que, se não consegue ser sempre superior coletiva e tecnicamente, tem alguma receita secreta para se manter na disputa o tempo inteiro e esperar que os seus macacos velhos decidam, como fez Ivan Perisic contra o Japão.
O ponto de virada para a Croácia nesse último ciclo foi a Eurocopa 2020 – disputada em 2021 por causa da pandemia. Até ali, parecia mesmo um time cujo auge havia ficado para trás. O técnico Zlatko Dalic preocupou-se com a renovação de algumas peças centrais, principalmente no sistema defensivo, e sabia que havia um limite do que poderia cobrar de um elenco que havia superado as expectativas para chegar à Copa do Mundo. No ano anterior à Euro, a Croácia levou 4 a 1 de Portugal, 4 a 2 da França, perdeu da Suécia, outra vezes de portugueses e franceses, empatou com a Turquia e abriu a campanha das Eliminatórias para a Copa do Mundo sendo derrotada pela Eslovênia.
Em nove jogos antes de estrear contra a Inglaterra, havia vencido apenas Chipre, por um magro 1 a 0, e a pequena Malta, por 3 a 0. Abriu a Eurocopa perdendo dos ingleses e apenas empatou com a Tchéquia. Quando precisou, porém, encaixou um grande jogo para vencer a Escócia por 3 a 1 e avançou às oitavas de final. Chegou a abrir o placar contra a Espanha, mas Ferrán Torres fez 3 a 1, aos 32 minutos do segundo tempo, um gol que parecia ter sepultado a breve reação croata no torneio. Nada disso: Mislav Orsic e Mario Pasalic marcaram nos minutos finais e forçaram a prorrogação. A Croácia perdeu de qualquer maneira, mas havia deixado claro que ainda tinha gasolina no tanque.
E mais do que tudo, aquela campanha serviu para reacender a chama de um time que vai se mostrando cada vez mais especial. Desde aquela derrota na prorrogação para a Espanha, a Croácia foi derrotada apenas uma vez, pela Áustria, na Liga das Nações. Nesse período, confirmou sua vaga na Copa do Mundo em primeiro lugar, à frente da Rússia, e ainda fez uma excelente campanha na Liga das Nações. Arrancou uma pequena revanche contra a França, ao vencer em Saint-Dennis, e derrotou duas vezes a Dinamarca, embalada pela semifinal da Eurocopa. Estará no final four em junho em busca do título contra Espanha, Itália e Holanda.
A Croácia poderia muito bem ter deitado em berço esplêndido depois da final de 2018 – como a Bélgica parece ter feito, com um resultado pior. Não precisaria de mais nada para marcar essa geração. Mas tantas e tantas vezes mostrou desde então que esse não é esse o seu DNA. Que nenhum título tenha sido conquistado, Luka Modric, Ivan Perisic e tantos outros nomes importantes dessa caminhada têm o coração de um campeão. E com ele tentarão chegar o mais longe possível na Copa do Mundo do Catar.