Calciopédia
·06 de agosto de 2019
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O futebol holandês revolucionou o futebol taticamente no início dos anos 1970, com os protagonistas Johan Cruyff, dentro do campo, e Rinus Michels, fora dele. O jogador é tratado como um dos maiores gênios que o futebol já teve e o técnico foi considerado o treinador do século, pela Fifa. Mesmo não sendo campeã mundial, a seleção holandesa encantou e foi eternizada, com seu pioneirismo e futebol vistoso.
Em escala menor, Giovan Battista Fabbri entrou para a história do futebol italiano trazendo ideias novas e ofensivas em uma época que a zona mista reinava, porém jamais foi campeão italiano. Gibì, como era conhecido, em referência às iniciais de seu nome (GB), teve como grandes feitos revelar Fabio Capello na Spal e, anos depois, transformar Paolo Rossi em centroavante e levar o Vicenza a uma histórica segunda posição na Serie A.
Nascido em San Pietro Casale, zona metropolitana de Bolonha, em 1926, Fabbri começou a jogar profissionalmente com 19 anos, na Centese, formação da província de Ferrara. Depois de atuar dois anos na Serie C, ajudou a levar a pequena equipe para a Serie B e se transferiu para o Modena, que jogava a primeira divisão. Depois de um biênio ali, Gibì foi jogar no Messina, time siciliano que disputava a terceirona.
O bolonhês colocou o Messina na segunda categoria e ficou, ao total, sete anos no time insular. Depois da boa passagem na Sicília, já com 29 anos, Fabbri passou uma temporada na Serie A com a Spal, outra na segunda divisão com o Pavia e fechou a carreira sendo jogador e treinador do Varese.
É interessante notar como suas características dentro dos gramados influenciaram suas habilidades como técnico. Traduzindo literalmente, seu apelido nos tempos de jogador – Brusalerba – significava “queima-grama”. Isso porque Fabbri era um implacável atleta que aguentava correr por todo o campo e jogava em qualquer posição. Por curiosidade, essa movimentação intensa seria uma das principais características do futebol holandês de duas décadas adiante.
Depois de parar completamente de jogar futebol, aos 33 anos, Gibì se dedicou totalmente à carreira de treinador. O bolonhês trabalhou na base do Torino até 1963, quando foi contratado pela Spal, equipe em que teria sua primeira passagem de sucesso. De volta à Ferrara, o jovem técnico era, no papel, líder da formação juvenil, mas foi interino do time principal em algumas ocasiões.
Em uma delas, lançou à esquadra principal o jovem Fabio Capello, com 18 anos de idade. Conhecido de Fabbri, sabia que o jogador não era como qualquer outro, “Era maduro, portava-se como um treinador já aos 16 anos de idade, no juvenil. Dava instruções de movimentação aos veteranos, buscava minha filha na escola, jantava em minha casa. Poderia jogar de líbero até os 50 anos de idade”, elogiou Gibì.
Depois de seis anos na Spal e de uma breve passagem nos juvenis do Cesena, Giovan assumiu os times principais da Sangiovannese e do Giulianova, ambos por um ano e na Serie C. No último dos trabalhos citados, levou a equipe da província de Teramo a um acesso para a segunda divisão. Fabbri, então, resolveu assumir um grande desafio e deixou o time abruzês para treinar o Livorno, que se encontrava então também no terceiro escalão do futebol itálico.
Giovan não durou nem um ano, já que – mesmo com resultados bons – era criticado pela diretoria por sua teimosia e pelo futebol pouco ortodoxo. Em certo momento, um superior lhe entregou qual seria a escalação do domingo, deixando o técnico enfurecido. O bolonhês não aceitou, colocou em campo pela última vez a sua própria escalação e assinou sua demissão logo após a peleja.
Fabbri foi para o Piacenza, clube em que ganhou a Serie C de 1974-75 mas no qual acabou rebaixado no ano sucessivo, por sérias carências no elenco. De qualquer forma, o futebol jogado pelo time emiliano era singular e grandioso, o que rendeu elogios da estrela Sandro Mazzola. O interista dizia que os lupi tinham “o melhor futebol praticado na Itália” naquela temporada. Não era pouca coisa, principalmente porque se tratava de um time de segunda divisão, com um jovem treinador de quase 50 anos, que tinha um lema inovador: “o primeiro atacante deve ser o goleiro”, costumava repetir. Num país acostumado com sistemas defensivos, o entendimento de que a construção ofensiva começava com o camisa 1 era bastante moderna.
Giuseppe Farina, presidente do Lanerossi Vicenza, conseguiu, no mesmo verão de 1976, contratar Fabbri para ser técnico e um ponta-direita com o nome de Paolo Rossi. O bolonhês tinha como meta levar o time do Vêneto para a Serie A e desenvolver a promessa recém-contratada da Juventus, com a chance de ouro de poder deslanchar na sua carreira profissional. Foram duas tacadas de mestre.
Além de ser quase como um segundo pai para Paolo, Giovan fez a mudança que garantiria o tricampeonato mundial para a Itália: Rossi não seria mais um ponta, e sim um centroavante. Como toda ótima história do futebol, esta mudança não aconteceu de forma repentina e precisou de um empurrão do destino. O time precisava de centroavantes e não tinha a opção de contratar, colocando o técnico em uma posição complicada.
Foram três anos em Vicenza – dois deles, mágicos. Na Serie B de 1976-77, o time foi campeão e Rossi foi o artilheiro, com 21 gols; na Serie A do ano seguinte, os berici alcançaram uma espetacular e inédita segunda colocação, com cinco pontos a menos que a Juventus. O vice-campeonato vicentino resultou na melhor temporada de uma equipe vêneta até aquele momento – feito superado apenas pelo Verona, que faturou o scudetto em 1985. Mais uma vez, Paolo Rossi se sagrou como goleador da categoria, com 24 gols, e ganhou uma convocação para a Copa de 1978. Fabbri, por sua vez, foi eleito como Seminatore d’Oro, prêmio conferido ao melhor treinador do ano na Itália.
Infelizmente, para Fabbri, o terceiro ano não correu da melhor forma. Farina fez uma loucura do ponto de vista financeiro e gastou mais do que podia para manter Rossi, deixando de reforçar outros setores da equipe. O Lanerossi Vicenza não conseguiu conciliar a disputa da Copa Uefa, da Serie A e da Coppa Italia, além de ter sofrido com venda de jogadores importantes, como Giuseppe Lelj e Roberto Filippi. Para piorar, uma lesão de Paolo Rossi logo no início da temporada, complicou mais ainda os planos.
Mesmo com 15 gols de Pablito, o time caiu na primeira fase do torneio continental e foi rebaixado para a Serie B. O time vêneto se desmontou e o técnico resolveu mudar os ares, assumindo o Ascoli, no que seria sua última passagem aclamada pela primeira divisão. Um quinto lugar (que se transformou em quarto, depois das punições derivadas do escândalo Totonero) foi alcançado por Fabbri, que levou o time marquesão também à sua maior colocação na história.
Lamentavelmente, depois disso sua carreira tomou um rumo de poucos sucessos. A entrada de estrangeiros na Serie A mudou de forma contundente o futebol jogado no país mediterrâneo, e o treinador, antes conhecido como revolucionário, não conseguiu acompanhar as mudanças dos anos 1980.
Cesena, Catania e Reggiana foram os times treinados por Giovan entre 1981 e 1984, e todos acabaram rebaixados – os dois primeiros, da Serie A para a B, e o último, da segunda para a terceirona. Na Serie C1, Fabbri até conseguiu um certo sucesso com o Catanzaro, levando a equipe calabresa de volta à Serie B, e depois teve passagens breves por Foggia e Bologna, também nas divisões inferiores. Em Bolonha, sua cidade natal, conseguiu salvar os felsinei de um vexaminoso rebaixamento à terceirona, mas não permaneceu para 1987-88 porque o clube já tinha um acordo com Luigi Maifredi.
Entre 1987 e 1993, Gibì alternou entre os cargos de treinador e diretor de futebol na Spal, e teve ainda mais algumas passagens breves como técnico no Venezia e no Catanzaro. Depois de incríveis 48 anos consecutivos no futebol, nos quais desempenhou diversas funções, Giovan Battista se aposentou, em 1993, quando estava na Spal – clube que representou por 11 temporadas, no total. Fabbri continuou ligado ao futebol através de uma atividade beneficente até 1999, período em que treinou o Club Italia, time formado pelos campeões mundiais de 1982 e que se reunia para amistosos.
Segundo o ex-treinador, “no futebol é preciso harmonia, como em uma orquestra”. Mesmo que seus times não tenham conquistado títulos grandiosos, suas filarmônicas produziram algumas das músicas mais belas já tocadas na Itália. Não é incomum termos de testemunhar pioneiros que apenas recebem os créditos devidos muito após o término de suas carreiras. Fabbri foi um deles. Depois de sua morte, aos 89 anos, o centro de treinamentos da Spal recebeu o nome de um dos mais inovadores profissionais da Itália. Nada pode maior do que ser aclamado por suas ideias, que tiveram um impacto imensurável no futebol local.
Giovan Battista Fabbri Nascimento: 8 de março de 1926, em San Pietro in Casale, Itália Morte: 2 de junho de 2015, em Ferrara, Itália Posição: meio-campista Clubes como jogador: Centese (1945-47), Modena (1947-49), Messina (1949-55), Spal (1955-56), Pavia (1956-57) e Varese (1957-59) Títulos como jogador: Serie C (1950) Carreira como treinador: Varese (1957-59), Spal (1964-65, 1969-70, 1987-88 e 1991-93), Sangiovannese (1971-72), Giulianova (1972-73), Livorno (1973-74), Piacenza (1974-76), Lanerossi Vicenza (1976-79), Ascoli (1979-81), Cesena (1981-82), Reggiana (1982-83), Catania (1983-84), Catanzaro (1984-85), Foggia (1985-86), Bologna (1986-87), Venezia (1988-89) Títulos como treinador: Serie C (1975), Serie B (1977) e Serie C1 (1985 e 1992)