oGol.com.br
·11 de abril de 2025
Herança do futebol traz promessa 'brasileira' para a seleção búlgara

In partnership with
Yahoo sportsoGol.com.br
·11 de abril de 2025
Se para você, a única relação entre Brasil e Bulgária no futebol aconteceu nos gramados (e nas noites) catalãs, com uma parceria inesquecível e magnética entre Romário e Stoichkov, essa história que vou te trazer vai apresentar um laço ainda mais duradouro, que na verdade é uma herança. De um pai que saiu do interior de Minas Gerais para tentar a sorte na Bulgária. Por lá ficou, criou raízes e agora cria um filho, que é considerado uma das promessas do futebol no país. É a história de Eli e Luca Marques.
Muito longe daquele Barcelona de Johan Cruyff, que administrou dois gênios "indomáveis", temporal e geograficamente, Eli Marques jogava o Módulo II do Campeonato Mineiro com o Social. Dirigentes búlgaros estavam em Minas Gerais para observar jogadores do URT, mas foi Eli que chamou a atenção deles.
A porta de entrada na Bulgária foi o Belasitsa Petrich. Começou ali uma história que durou década e meia em campo. No início, Eli lembra que não teve boas impressões do país, que cortou laços com o comunismo no fim de 1989, com a destituição de Todor Zhivkov, mas continuou com problemas econômicos e estruturais em uma democracia que engatinhava.
"Minhas primeiras impressões não foram muito boas. Quando cheguei, em 2007, o país tinha acabado de sair do comunismo. Era um pouco mais difícil, por ser um país um pouco pobre, você tem algumas dificuldades, até para a adaptação. Mas o bom é que cheguei no verão, quente, o difícil foi quando chegou no inverno. Era difícil, nos treinamentos, jogos, tinha que procurar algum jeito para esquentar o pé para sentir a bola", lembra Eli, em conversa com a reportagem de oGol.
Atacante de velocidade, Eli lembra que sofreu um pouco para se adaptar em campo a um jogo mais físico, "de contato e chutão para cima". Adaptado, o brasileiro viveu o ápice no Cherno More, chegou a passar pelo AEL Limassol, do Chipre, mas criou raízes mesmo na Bulgária, retornando ao país para encerrar lá a carreira.
O companheiro mais marcante nos tempos de Bulgária foi o artilheiro Mário Jardel, com passagens vitoriosas por Palmeiras e Vasco e ídolo em Portugal com as camisas de Porto e Sporting. Os dois jogaram juntos no Cherno More. Para além dos treinos de finalização que impressionaram Eli, principalmente pelo alto, uma passagem com Jardel nas ruas de Varna chamou a atenção.
"Uma vez a gente estava passeando no centro de Varna, e a gente passou em frente a uma faculdade. Alguns estudantes turcos estavam lá, reconheceram o Jardel e começaram a cantar uma música de quando ele tinha jogado na Turquia, começaram a ovacionar ele naquele momento. Parou na rua, num sinal, quase dez estudantes, começaram a cantar, abraçar ele, tirar foto", recordou.
Casado com uma búlgara, Eli teve um filho nascido no país e, depois de encerrar a carreira, resolveu ficar por lá. Quis o destino que Luca também se tornasse jogador de futebol, e em uma posição bem diferente da do pai.
"Ele tinha uma 'queda' para o gol, mas falei pra ele: 'filho, para de pegar a bola com a mão e chuta para o gol'. Aos oito anos, começou a disputar torneios, começou a ser artilheiro. A gente mudou para Varna, ele começou a treinar no Cherno More. Um dia, faltou o goleiro, e ele falou para o treinador que ia para o gol. Fez um treino muito bom, o treinador gostou, e continuou no gol. Nesses três anos que ele já está como goleiro, ele conquistou bastante coisa, confiança dos maiores scouts e clubes daqui", contou Eli.
Luca já foi convocado cinco vezes para a seleção sub-15 da Bulgária. Hoje dono de uma agência para jogadores com a esposa, Eli acredita que, no futuro, Luca terá condições de decidir se continuará defendendo a seleção do país em que nasceu, ou se abrirá a opção de jogar na seleção brasileira.
"Na minha geração, era muito difícil chegar na seleção. Na dele, com tudo que estou vendo ele fazer com 14 anos, acredito que ele não está longe. Pelo nível que está mostrando com essa idade, sendo sincero. Claro que o país que a gente está não é tão reconhecido. Mas a gente deve mudar para outro país, já teve sondagens de outros clubes. Se acontecer, vai dar uma visibilidade melhor para ele. Tem toda a chance de disputar uma vaga na seleção brasileira sub-15 também no ano que vem. Mas ele tem de fazer a escolha dele. Se ele escolher pela seleção brasileira, vou ficar muito feliz", revelou Eli.
Luca teve as respostas traduzidas pelo pai, já que pouco fala português. Perguntado sobre qual seleção escolheria, deixou as portas abertas para o país de nascimento do pai.
"Como tenho os dois passaportes, tenho o direito de jogar pelo Brasil ou pela Bulgária. Vou trabalhar e dar o meu melhor para que um dia eu possa receber uma chance de representar o Brasil", garantiu.
O menino já visitou o Brasil, garante ser fã de Ederson, goleiro do Manchester City, justamente pelo jogo com os pés, e revela um carinho especial pelo Cruzeiro.
"Sei que é um dos melhores campeonatos do mundo (o Brasileiro), e gosto do Cruzeiro porque quando estive no Brasil, em setembro de 2017, o Cruzeiro foi campeão da Copa do Brasil contra o Flamengo e meu tio me deu uma camisa", lembrou.
Hoje, Luca, que sonha um dia jogar na Espanha, defende as categorias de base do CSKA 1948, de Sofia, e recentemente esteve mais uma vez com a seleção sub-15, motivo de orgulho.
"A sensação de jogar pela seleção é muito emocionante. A primeira vez que fui, fiquei nervoso, o que é normal. Mas quando chega a hora de entrar em campo, a ansiedade desaparece e você começa a dar o seu melhor", contou.
Brasil e Bulgária continuam a provar que futebol é uma herança. E uma história, que começou lá em Coronel Fabriciano, rompeu barreiras culturais, geográficas e, também, futebolísticas. Em alguns anos, você pode ver um brasileiro jogando na seleção búlgara. Ou vice-versa. Só o tempo dirá.