Calciopédia
·11 de setembro de 2023
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Na Checoslováquia, pouco depois de Diego Armando Maradona levar o Napoli a seu primeiro scudetto, em 1987, um novo capítulo da história partenopea começava a ser escrito. Em Banská Bystrica, localidade de difícil pronúncia para os italianos e de costumes muito diferentes daqueles expressos no sul do Belpaese, nascia Marek Hamsík, um dos maiores craques que os azzurri viriam a idolatrar. Capitão, recordista em aparições pelo clube e um de seus principais artilheiros, o meia recebeu até um apelido que simbolizava a sua simbiose com os napolitanos, representada por um trocadilho feito com um dos lugares mais belos da capital da Campânia.
Ainda garotinho, Marek deu seus primeiros passos no modesto Jupie Podlavice, de sua cidade natal, e impressionou pelo desempenho na base. O meia ambidestro chegou a interessar ao Sparta Praga, da Chéquia, mas assinou mesmo com o Slovan Bratislava, da capital da Eslováquia. Após dar continuidade a sua formação vestindo celeste, estreou profissionalmente em 2004 e durou pouquíssimo em seu país. Em agosto, depois de seis partidas e um gol pela segundona nacional, o Brescia desembolsou apenas 60 mil euros e o levou para a Itália.
Hamsík, que ainda tinha 17 anos, foi agregado à equipe Primavera do Brescia, mas rapidamente deu as caras entre os profissionais. Depois de algumas partidas no banco de reservas, estreou na Serie A em março de 2005, na derrota dos biancazzurri para o Chievo, por 3 a 1 – se tornando o terceiro atleta de seu país, após a dissolução da Checoslováquia, a disputar a competição, sucedendo Milos Glonek e Vratislav Gresko. Foi a sua única aparição na temporada, que terminou com o rebaixamento dos lombardos para a segunda divisão, após uma campanha inteirinha na parte de baixo da tabela.
Na Serie B, Hamsík, já maior de idade, teria o cenário ideal para uma transição de menos pressão para o futebol profissional. Desde aquela época o jogador, desenvolveu duas marcas registradas: o cabelo com corte moicano e as meias arriadas. Com este visual, passou a ganhar espaço no time do técnico Rolando Maran a partir de novembro de 2005, após anotar um belo gol em chute rasteiro de fora da área sobre o Milan, pelas oitavas de final da Coppa Italia – foi o seu primeiro tento em solo italiano. Marek somou 28 aparições na temporada, mas o Brescia, já treinado pelo checo Zdenek Zeman, ficou apenas na 10ª posição da segundona.
Para a temporada 2006-07, um Hamsík totalmente integrado ao futebol profissional pode apresentar todo o seu potencial na Itália – o que lhe permitiu passar das seleções de base da Eslováquia à presença entre os convocados da equipe principal a partir de fevereiro de 2007, quando estreou num amistoso contra a Polônia. Marek precisou dar duro para encarar uma Serie B turbinada pelas presenças de Juventus – rebaixada após o esquema de manipulação de resultados que resultou no escândalo Calciopoli –, Napoli, Genoa, Bologna, Lecce, Piacenza, Verona e outros clubes tradicionais que estavam na divisão de acesso. E não fez feio.
Hamsík, graças ao talento e ao vigor incontestáveis, já era titular e um dos pilares do Brescia. Sendo assim, participou de 40 das 42 rodadas da Serie B, com 10 gols marcados – sete a partir de cobranças de pênalti, uma de suas especialidades. Um dos três com a bola rolando, vale dizer, foi contra o Napoli, em derrota dos andorinhas por 3 a 1 no San Paolo. O seu time foi sexto colocado e não conseguiu o acesso, mas Marek desabrochou definitivamente para o futebol.
Hamsík chegou à Itália muito cedo e deslanchou com a camisa do Brescia, na Serie B (Il Giornale di Brescia)
A excelente temporada do jovem eslovaco chamou a atenção do Napoli, que conseguira o acesso na segunda colocação, atrás da Juve. Na janela do verão europeu de 2007, o presidente Aurelio De Laurentiis desembolsou 5,5 milhões de euros para levar o jogador de 20 anos para Nápoles. Hamsík, assim, se juntava ao início do projeto de reconstrução do time partenopeo, que ainda contaria com outras novas aquisições, como Ezequiel Lavezzi e Walter Gargano. Por incrível que possa parecer em perspectiva, a torcida azzurra não se entusiasmou com a chegada do trio – mas eles provariam que a avaliação das bancadas estava totalmente equivocada.
Logo de cara, Hamsík fez 40 partidas na temporada de estreia pelo Napoli, sendo o jogador mais utilizado por Edoardo Reja. No 3-5-2 do treinador, o eslovaco fez sempre a função de meia interno pela esquerda, sendo incansável para correr atrás dos adversários, armar jogadas e, de quebra, combinar muitas chegadas às áreas adversárias: por conta disso, marcou 10 gols ao longo do ano e forneceu quatro assistências. De quebra, Marek ainda foi o artilheiro do time na Serie A – foram nove tentos, todos com a bola rolando – e vazou adversários de relevo, como Roma, Lazio (duas vezes) e Milan. No fim das contas, os partenopei ficaram na oitava posição e garantiram uma vaga na Copa Intertoto, o que era suficiente para um clube que voltava à elite após um período obscuro, com direito a falência e passeio na terceira divisão.
Era cristalino que Marek iniciara a sua história de amor com o clube da melhor forma, deixando as desconfianças em segundo plano. A plenos pulmões, os partenopei já entoavam o apelido cunhado pelo narrador-torcedor Raffaele Auriemma: o eslovaco era chamado de Marekiaro, alcunha que surgiu de um trocadilho com a localidade de Marechiaro, situada no bairro de Posillipo. Aquele pedaço de Nápoles, conhecido por seu mar azul de águas calmas e por uma vista deslumbrante da cidade, do Vesúvio, da Ilha de Capri e da Península Sorrentina, fervilhou durante a década de 1960, quando foi frequentado por estrelas de Hollywood e pela nata da dolce vita italiana. Seguindo o exemplo da região, o futebol de Hamsík, que já era encantador como as suas ruelas, viria a se tornar digno de cinema nos anos seguintes.
O meia eslovaco começou a temporada seguinte em estado de graça. Nas sete primeiras rodadas da Serie A, balançou as redes de Roma, Fiorentina, Palermo e Juventus – o Napoli venceu os três últimos jogos citados. Embalado pelas grandes atuações de Hamsík, a metade inicial de campeonato dos azzurri foi fenomenal, com desempenho de quinto lugar.
Contudo, o time campano caiu de produção com a virada de ano: bateu somente o Catania, ainda pela 18ª rodada, no jogo inaugural de 2009, e só voltou a triunfar no fim de abril, contra a Inter. Nesse meio tempo, Reja foi demitido em março, dando lugar a Roberto Donadoni – que não resolveu os problemas do Napoli. Os partenopei tiveram o segundo pior aproveitamento do returno e concluíram a Serie A na 12ª posição.
A contratação do eslovaco foi alvo de desconfiança da torcida do Napoli, mas logo Hamsík provou que havia um equívoco (New Press/Getty)
Hamsík, apesar de também ter caído de rendimento, terminou a temporada com 12 gols e sete assistências em 40 aparições. Mais: recebeu, ainda em janeiro de 2009, o prêmio Oscar del Calcio como melhor jovem da competição, superando Sebastian Giovinco e Mario Balotelli. Foi o primeiro estrangeiro a ter esta honra.
Em 2009-10, visando buscar maiores ambições nas competições, o Napoli fez contratações importantes, como as de Fabio Quagliarella, Hugo Campagnaro, Juan Camilo Zúñiga e Morgan De Sanctis. Apesar disso, o time não começou bem sob as ordens de Donadoni, que foi demitido após a sétima rodada, em outubro de 2009, para dar lugar a Walter Mazzarri. Hamsík foi um dos jogadores que passaram incólumes à má fase, visto que marcou cinco gols neste período.
Sob as ordens do novo treinador, Marekiaro mudou de posição: foi avançado em campo, para atuar ao lado de Lavezzi, mais próximo a Quagliarella, no 3-4-2-1 de Mazzarri. Na função, que lhe permitia aproveitar ainda mais o seu grande poder de finalização, guardou logo uma doppietta na vitória do Napoli sobre a Juventus, em Turim, por 3 a 2 – havia 21 anos que os azzurri não batiam a Velha Senhora no Piemonte. De quebra, os partenopei chegaram a emendar 15 rodadas seguidas sem derrotas na Serie A.
Cada vez mais importante para o Napoli, em março de 2010, na partida contra a Fiorentina, Hamsík usou pela primeira vez a braçadeira de capitão do time: aos 22 anos e 229 dias, se tornou o mais jovem a vestir a faixa, superando o recorde que pertencia a Antonio Juliano. Marek concluiu 2009-10 com 12 gols marcados e, pela terceira vez consecutiva, com a artilharia napolitana. Antes do meia, o último jogador partenopeo a ter sido o principal goleador da equipe por pelo menos três temporadas seguidas havia sido Maradona, entre 1984 e 1988.
Na temporada em que ajudou o Napoli a ser sexto colocado da Serie A e a garantir vaga na Liga Europa, Hamsík também levou a Eslováquia a sua primeira Copa do Mundo. Não à toa, o capitão da seleção ainda foi eleito como Jogador Eslovaco do Ano – um prêmio que ganharia oito vezes ao longo da carreira, em 2009, 2010, 2013, 2014, 2015, 2016, 2017 e 2018.
A idolatria de Marekiaro no Napoli começou a ser construída com gols importantes, principalmente sobre a Juventus (Getty)
Na África do Sul, Marekiaro contribuiu de forma decisiva para que os falcões ficassem com a segunda vaga do Grupo F para as oitavas de final, atrás do Paraguai e à frente de Nova Zelândia e Itália. Após empatar com a seleção da Oceania e perder para a sul-americana, a Eslováquia teve de derrotar a Squadra Azzurra, então campeã mundial, na última rodada: no triunfo por 3 a 2 sobre um time repleto de conhecidos, Hamsík forneceu uma assistência. A histórica participação dos eslovacos foi encerrada com derrota para a Holanda, na fase inaugural do mata-mata.
Após a boa campanha no Mundial, o meia voltou ao Napoli e ganhou um companheiro que roubaria seu lugar de artilheiro do time: Edinson Cavani, contratado junto ao Palermo para substituir Quagliarella, vendido à Juventus. Hamsík, contudo, brilhou mais intensamente depois da chegada do uruguaio, com quem formou o primeiro dos tridentes – ou quartetos – que comporia na Campânia. Inicialmente, os dois tiveram a companhia de Lavezzi; em 2011-12, Goran Pandev se juntou ao grupo como auxiliar.
Embalado pelo tridente, o Napoli fez uma belíssima campanha na Serie A – na Liga Europa e na Coppa Italia, contudo, caiu precocemente. Além de marcar 13 gols, que o fizeram ser vice-artilheiro do time, Hamsík intensificou o seu papel de propiciador de chances para os colegas: foram oito assistências no campeonato, mas sua inteligência resultaria em muitas outras oportunidades concluídas por seus colegas e principalmente por Cavani, segundo principal goleador do Italiano, com 26 tentos. Os azzurri se classificaram para a Champions League, devido à terceira posição, e Marekiaro foi incluído na equipe do ano no Oscar del Calcio.
Em 2011-12, Hamsík foi promovido a vice-capitão do time, que fez um bom mercado para a disputa da Champions League e o objetivo de fazer bonito também na Serie A e na Coppa Italia – para auxiliar Marekiaro na criação e no meio-campo, por exemplo, chegaram Pandev, Gökhan Inler e Blerim Dzemaili. Apesar de muitos momentos de ótimo futebol, os azzurri produziram trajetória irregular no Italiano, que concluíram na quinta colocação. O resultado foi compensado por um grande desempenho nas copas.
O Napoli foi sorteado num grupo forte da Liga dos Campeões, ao lado de Manchester City, Villarreal e Bayern Munique. Mesmo assim, o time partenopeo conseguiu a classificação para as oitavas de final, quando foi eliminado na prorrogação pelo Chelsea, que viria a vencer a competição naquela temporada. Hamsík marcou seus primeiros gols no torneio, ambos contra os espanhóis – um deles, num jogo em que também deu assistência, resultou na vaga no mata-mata.
Líder técnico e anímico, Hamsík fez parceria de sucesso com Lavezzi e, posteriormente, também com Cavani (Getty)
Em solo nacional, pela Serie A, Hamsík forneceu sete assistências e nove gols – entre os quais, um em vitória sobre a Inter e outro em empate com a Juventus. Entretanto, os verdadeiros motivos de comemoração vieram à tona na Coppa Italia. Depois de superar Cesena, Inter e Siena, o Napoli disputou a final com a Juventus, que começara sua era dominante no futebol italiano e estava invicta na temporada. Os comandados de Mazzarri, porém, tiveram uma atuação de gala e venceram graças a um pênalti convertido por Cavani e uma finalização rasteira de Marekiaro. Foi o primeiro troféu da carreira do eslovaco e a primeira grande conquista dos azzurri em 22 anos. A anterior datava dos tempos de Maradona.
A temporada seguinte foi incrível para o Napoli e para, embora nenhum título tenha sido conquistado. O ano começou com o troco dado pela Juventus na Supercopa Italiana e as quedas precoces nas copas permitiram maior atenção à Serie A, competição em que os azzurri chegaram a brigar com a Velha Senhora pelo scudetto. Contudo, o time campano derrapou entre rodadas 24 e 28, quando acumulou cinco jogos sem vitórias, e permitiu a fuga da rival – não adiantou sequer engatar oito triunfos nas 10 últimas jornadas. Apesar do amargor pelo desfecho, aquele foi o melhor posicionamento do clube no campeonato desde o scudetto obtido em 1990.
Hamsík, obviamente, foi um dos maiores destaques não só do Napoli, mas da Serie A como um todo. Os azzurri tiveram o melhor ataque, com 73 gols marcados, sendo 29 do artilheiro Cavani, e Marekiario veio logo atrás: anotou 11. Com a saída de Lavezzi para o Paris Saint-Germain e a promoção do garoto Lorenzo Insigne ao time principal, em revezamento com Pandev, o eslovaco teve ainda mais responsabilidades para articular jogadas. E teve sucesso, pois participou diretamente de 17 tentos só no Italiano – em toda a temporada, foram 20. Números simplesmente acachapantes.
No verão europeu de 2013, o Napoli passou por uma revolução: saíram Mazzarri, Cavani, Campagnaro e De Sanctis, e chegaram o técnico Rafa Benítez, Gonzalo Higuaín, Dries Mertens, Pepe Reina, Raúl Albiol e José Callejón. Paolo Cannavaro, capitão do time, pouco jogaria com o técnico espanhol e, no mercado de inverno, deixaria a Campânia. Hamsík, que já usava a faixa de capitão frequentemente, foi oficializado como dono da braçadeira. E, além disso, estavam postas as bases para a construção de outro ataque marcante na história partenopea, o qual teria o eslovaco como sustentáculo.
Esse ataque lendário na memória do torcedor napolitano não teria Higuaín, em que pese a sua importância nos três anos em que defendeu o Napoli – afinal, Pipita gravaria o seu nome na história do clube por conta dos gols marcados, mas sobretudo por ter aceitado trocar os azzurri pela Juventus. O argentino terminaria sendo a antítese da fidelidade de Hamsík, que recusou diversas propostas para seguir em Nápoles: Inter, Juventus e Milan, na Itália; Manchester United, Manchester City, Chelsea e Real Madrid, fora dela, chegaram a cogitar a contratação do eslovaco, que não deu aval a nenhuma tratativa e ainda preferiu encerrar seu vínculo com o empresário Mino Raiola, em 2012, para permanecer na Campânia. Por isso e muito mais, Marek veria sua moral aumentar mais ainda como líder do quarteto formado com Callejón, Insigne e Mertens.
O meia eslovaco foi peça fundamental do Napoli por mais de uma décadae integrou times históricos dos azzurri (Getty)
Mas, antes disso tudo se desenrolar, Hamsík, Higuaín, Mertens, Callejón e Insigne coexistiram por três anos – nos quais o belga era uma opção de banco frequentemente utilizada. Em 2013-14, o primeiro do efêmero quinteto, Marekiaro simplesmente guardou uma doppietta nas duas rodadas inaugurais da Serie A, em vitórias sobre Bologna e Chievo. Jogando centralizado como trequartista no 4-2-3-1 de Benítez, viu seu papel de garçom diminuir um pouco devido à modificação dos mecanismos de funcionamento do time, mas seguiu tendo importância para girar a bola: quase tudo passava por seus pés.
Em novembro de 2013, contra o Parma, ocorreu algo raríssimo na carreira de Hamsík: uma lesão. Presença constante no time do Napoli até ali, o eslovaco ficou quase dois meses de molho por conta de um pisão sofrido naquele jogo – mas, depois de se recuperar, jamais se ausentou longamente outra vez. Privilegiado fisicamente, retomou o seu lugar no meio-campo partenopeo e foi o maestro de mais duas ótimas campanhas. Na Serie A, anotou sete gols e forneceu seis assistências, ajudando os azzurri a ficarem com o terceiro lugar e uma vaga na Champions League; na Coppa Italia, deu um presente para Insigne abrir o placar na vitória por 3 a 1 sobre a Fiorentina, na final. Capitão napolitano, Marekiaro foi o responsável por erguer a taça.
A temporada 2014-15 seria a última de Benítez pelo Napoli – para a alegria de Hamsík, que poderia voltar a exercer a sua função preferida, menos centralizado e com mais liberdade de cair pela esquerda. Durante esta campanha, os azzurri venceram a Supercopa Italiana em disputa de pênaltis com a Juventus, permitindo a Marekiaro erguer mais uma taça, mas não se deram bem nas outras competições: com a quinta posição na Serie A não conseguiram vaga na Champions League; além disso, caíram nas semifinais da Coppa Italia e da Liga Europa. Individualmente, o eslovaco balançou as redes 13 vezes e possibilitou que os colegas o fizessem em outras 16.
Após a saída de Benítez, o presidente De Laurentiis buscou o emergente Maurizio Sarri no Empoli. Amante do 4-3-3, o novo técnico puxou Hamsík para o lado esquerdo do meio-campo, colocando-o ao lado de Jorginho e Allan – na frente, Callejón, Higuaín e Insigne resolviam, tendo Mertens de prontidão entre os reservas. Mais longe da baliza adversária, o eslovaco marcou menos gols (oito), mas as sete assistências deixam claro que ele continuou a ter papel central na circulação de bola do time, que se sagrou vice-campeão italiano, nove pontos atrás de uma Juventus praticamente imbatível.
Em 2016, Hamsík também pode disputar o seu segundo torneio expressivo pela Eslováquia. Com a extensão da Eurocopa de 16 para 24 seleções, a equipe nacional eslovaca obteve sua vaga e fez uma campanha honrosa: foi até as oitavas de final, onde perdeu para a Alemanha por 3 a 0. Na competição, Marek marcou um gol e forneceu uma assistência na vitória por 2 a 1 sobre a Rússia.
Como capitão, Hamsík levantou três taças pelo Napoli (Getty)
Poucos dias após o fim da Euro, o Napoli viu Higuaín, que marcara 36 gols na Serie A e quebrara o recorde da competição no quesito, se transferir para a Juventus por 90 milhões de euros. Arkadiusz Milik foi o contratado para substituí-lo, mas sofreu uma lesão no ligamento cruzado do joelho no início de outubro. Foi aí que Sarri descobriu o potencial de Mertens para ser centroavante e consolidou o quarteto mágico que o belga formou com Insigne, Callejón e, claro, Hamsík. Naquele ano, inclusive, o eslovaco colecionou feitos e grandes atuações.
Na temporada 2016-17, Hamsík atuou em 49 das 50 partidas do Napoli, que foi terceiro colocado da Serie A, com 86 pontos – em ano atípico, os três primeiros superaram os 80 –, semifinalista da Coppa Italia e eliminado pelo Real Madrid nas oitavas de final da Champions League. Naquela campanha, Marekiaro superou Maradona em número de gols no Campeonato Italiano e a marca de 100 tentos com a camisa azzurra.
Hamsík foi um dos grandes meias da temporada italiana e, somando todas as competições, atingiu o seu recorde pessoal com 15 gols marcados, além de ter participado diretamente de outros 12. Naquele ano, que foi um dos melhores de sua carreira, o eslovaco balançou as redes de Inter e Juventus (duas vezes), e ainda protagonizou atuações estrepitosas nas goleadas fora de casa sobre Cagliari (5 a 0) e Bologna (7 a 1), pela Serie A. Ante os sardos, guardou uma na casinha e forneceu três assistências; depois, castigou os emilianos com uma tripletta. O time bolonhês, aliás, foi a vítima preferida de Marekiaro em sua carreira, com nove tentos sofridos – em seguida, ocupam o pódio Palermo (oito), Cagliari, Juve e Sampdoria (sete).
Após completar 10 temporadas pelo Napoli e prestes a comemorar 30 anos de vida, Hamsík já era uma bandeira do clube – possivelmente a maior do século XXI e uma da maiores da história. Quis o destino que, na campanha em que ele quebraria uma das marcas mais expressivas de sua carreira, o seu desempenho geral não tenha sido tão bom.
Em 2017-18, Marekiaro produziu rendimento irregular e pouco brilhante, sendo o reflexo do time. O Napoli teve resultados inexpressivos nas copas, mas, ainda assim, conseguiu um aproveitamento incrível na Serie A – provando que, mesmo sem estar no ápice de sua forma sob o ponto de vista técnico, Hamsík era capaz de entregar bons resultados. Apesar de ter jogado um futebol burocrático por boa parte da campanha, a equipe de Sarri fez incríveis 91 pontos no campeonato. Só não foi campeã porque a Juventus foi melhor: somou 95.
Hamsík quebrou recordes pelo Napoli e formou tridente especial com Mertens e Insigne, que lhe superariam na artilharia do clube pouco depois (Getty)
Naquela temporada, Hamsík forneceu somente três assistências e anotou sete gols. Um deles, porém, foi absolutamente memorável: no dia 23 de dezembro de 2017, às vésperas do Natal, o eslovaco contribuiu para a vitória por 3 a 2 sobre a Sampdoria e ultrapassou Maradona como o maior artilheiro da história partenopea, com 116 tentos em sua conta. Meses depois, já durante a campanha de 2018-19, foi a vez de derrubar outro recorde: no empate por 2 a 2 com o Paris Saint-Germain, na França, pela Champions League, Marekiaro vestiu a camisa azzurra pela 512ª vez na carreira e assumiu a liderança em número de aparições pelo Napoli. O posto pertencia a Giuseppe Bruscolotti.
Mas, a bem da verdade, o fim da trajetória de Hamsík pelo Napoli estava próximo. O eslovaco sentiu bastante a perda do scudetto, considerando que os azzurri lideraram a Serie A em grande parte da temporada, e chegou a ser sondado por equipes da China em junho de 2018. Contudo, o clube partenopeo buscou Carlo Ancelotti para substituir Sarri, que acertaria com o Chelsea após seu ciclo na Campânia se encerrar, e Marek decidiu permanecer aos pés do Vesúvio.
Sob as ordens de Carlo, a classe de Marekiaro permaneceu, mas os números de gols e assistências, que já vinham diminuindo, caíram bruscamente: em 2018-19, foi recuado por Ancelotti para atuar como regista no esquema 4-4-2, de modo que se dedicou mais a funções defensivas. Assim, marcou apenas uma vez e só deu um passe-chave aproveitado por colegas, ambos contra o Estrela Vermelha, na Champions League. As suas aparições também foram menos frequentes: por conta de sua idade e por filosofia do técnico, Hamsík começou a ser preservado em algumas partidas. O que não deu resultado, já que ele sofreu uma lesão na coxa – apenas a segunda em sua longa passagem pelo Napoli.
No fim das contas, a perda de protagonismo de Hamsík no time de Ancelotti, aliada à ascensão de meio-campistas mais jovens, como Piotr Zielinski e Fabián Ruiz, além dos mais defensivos Allan e Amadou Diawara, levariam ao encerramento da passagem de Marekiaro pela Campânia, 11 temporadas e meia depois de sua chegada. No dia 2 de fevereiro de 2019, num 3 a 0 sobre a Sampdoria, a mesma adversária contra a qual superou Maradona na artilharia azzurra, entraria em campo pelo Napoli pela última vez.
Após completar 520 partidas, marcar 121 gols e contribuir diretamente para 103 outros tentos, o capitão napolitano foi vendido por cerca de 20 milhões de euros para o Dalian Yifang, da China, que pouco depois mudaria de nome para Dalian Professional. Marek deixaria o Napoli como recordista em aparições e bolas nas redes. Em 2020, Mertens o superaria na artilharia histórica do clube e, em 2022, Insigne lhe tomaria a vice-liderança – o belga chegou aos 148 e o italiano anotou 122.
Hamsík decidiu deixar o Napoli depois de leve queda de rendimento, quando não tinha mais nada a provar (AFP/Getty)
Assim que a sua saída foi confirmada, Hamsík publicou, nas redes sociais, uma carta de despedida para a torcida do Napoli, na qual evidenciou todo o seu amor pelo clube e pela capital da Campânia. “Eu tatuei ‘Napoli’ na minha pele, assim como nossa primeira vitória na Coppa Italia, após 25 anos. É impossível esquecer aquele jogo. É impossível esquecer aquele momento em que superei a marca de Bruscolotti ou quando quebrei o recorde de gols dos azzurri, estabelecido pelo próprio deus do futebol, Diego Armando Maradona. Isso me deixa extremamente orgulhoso”, afirmou. Marekiaro também agradeceu ao presidente, aos companheiros, aos treinadores, ao estafe partenopeo e, claro, à torcida. “Aqui em Nápoles nasceram meus três filhos, que são napolitanos em todos os sentidos. Amo vocês [torcedores] e amarei esta cidade para sempre”, concluiu.
Na China, Marek viveu em Dalian, perto da fronteira com a Coreia do Norte, e colheu resultados medíocres pelo Dalian Professional, produzindo um rendimento individual bem inferior ao qual estava acostumado a entregar. No período, chegou a ser treinado novamente por Benítez entre julho de 2019 até a sua saída, em março de 2021. Visando se preparar melhor para a Eurocopa, adiada para o verão de 2021 no hemisfério norte, Hamsík preferiu deixar as incertezas do futebol chinês, mais afetado pelas políticas de combate à covid-19 do que outros mercados, e rumou à Suécia, cuja janela de transferências ainda estava aberta: acertou, portanto, um contrato de curta duração com o IFK Göteborg.
Hamsík disputou seis dos oito jogos possíveis do IFK até a pausa da Allsvenskan para a Euro e antes mesmo de a competição ter o seu pontapé inicial, firmou um novo vínculo com o Trabzonspor, da Turquia. Marek capitaneou a Eslováquia, que foi eliminada na fase de grupos do torneio continental, e depois das férias pode vestir azul e grená.
Com quase 35 anos, Marekiaro finalmente conquistou seu primeiro campeonato nacional: em 2021-22, o ambicioso projeto do Trabzonspor deu frutos e a taça Süper Lig foi levantada pelo clube sediado em Trabzon, às margens do Mar Negro. Em seguida, foi a vez de celebrar a Supercopa da Turquia. Contudo, Hamsík sentiu o peso da idade: as lesões, raríssimas, se tornaram frequentes. Em junho de 2023, então, se despediu dos gramados numa partida entre Eslováquia e Liechtenstein, pelas Eliminatórias da Euro 2024. Com 138 aparições e 26 gols, o meia é recordista em presenças e tentos pela seleção de seu país.
Hamsík deixou o futebol como um dos grandes de sua geração. Foi sondado por várias e várias temporadas para deixar o sul da Itália, mas se manteve firme em seu amor ao Napoli, onde conquistou a imortalidade. E, por nunca ter querido deixar os partenopei para, durante o seu ápice, atuar em times mais badalados e que competiam por títulos com frequência, Marekiaro certamente não teve o reconhecimento que merecia fora da Campânia e da Eslováquia. Independentemente disso, o meia está no panteão de maiores craques dos azzurri e de seu país – certamente foi o melhor eslovaco após a dissolução da Checoslováquia e briga com László Kubala pela primazia de todos os tempos. Uma lenda, em suma.
Marek Hamsík Nascimento: 27 de julho de 1987, em Banská Bystrica, Checoslováquia (atual Eslováquia) Posição: meio-campista Clubes: Slovan Bratislava (2002-04), Brescia (2004-07), Napoli (2007-19), Dalian Professional (2019-21), IFK Gotemburgo (2021) e Trabzonspor (2021-23) Títulos: Coppa Italia (2012 e 2014), Supercopa Italiana (2015), Süper Lig (2022) e Supercopa da Turquia (2023) Seleção eslovaca: 138 jogos e 26 gols