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·25 de julho de 2025

Mesmo sem títulos, o discreto Celeste Pin se tornou bandeira da Fiorentina

Imagem do artigo:Mesmo sem títulos, o discreto Celeste Pin se tornou bandeira da Fiorentina

Alguns jogadores atravessam o tempo sem jamais terem erguido um troféu de expressão, embora deixem marcas mais duradouras do que muitos campeões. Celeste Pin foi um desses casos raros. Zagueiro rochoso, de alma discreta e convicções sólidas, encontrou na Fiorentina não apenas um clube, mas um destino. O italiano do Vêneto viveu seus melhores anos vestido de violeta, fincando raízes na cidade de Florença com a mesma firmeza com que cravava os pés no gramado. Sua história, feita de fidelidade e amor declarado à equipe toscana, terminou em tragédia, porém permaneceu como testemunho de um vínculo que ultrapassou o futebol.

Celeste veio ao mundo em 25 de abril de 1961, em San Martino di Colle Umberto, no Vêneto. Uma região da Itália em que seu sobrenome é muito comum e que também foi o berço de Gabriele e Livio Pin, seus contemporâneos de Serie A – embora sem parentesco. O zagueiro, contudo, começaria a sua carreira mais ao centro do país, na Úmbria, com a camisa do Perugia.


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O zagueiro se formou pelo clube biancorosso e ascendeu ao profissionalismo em 1979-80, durante o período mais glorioso da história do Perugia – os grifoni haviam estreado na Serie A em 1975 e, quatro anos depois, conseguiram emplacar um vice-campeonato italiano de forma invicta. Aos 18, no fim de dezembro de 1979, Pin estreou nos últimos minutos de uma vitória magra sobre a Juventus.

Naquela temporada, Celeste ainda atuaria pouco pelo time comandado por Ilario Castagner e abrilhantado por Pierluigi Frosio, Salvatore Bagni e Paolo Rossi, mas ganharia a titularidade na reta final da competição e contribuiria para o sétimo lugar dos umbros. O motivo, porém, seria relacionado à futura desgraça do Perugia: o envolvimento de jogadores, incluindo Pablito, em apostas ilegais. Luciano Zecchini e Mauro Della Martira (a quem Pin substituiria) também foram pegos na investigação do escândalo Totonero e, após terem sido detidos, acabariam suspensos.

O zagueiro foi revelado pelo Perugia na temporada posterior ao histórico vice-campeonato nacional dos biancorossi (Guerin Sportivo)

Por conta da participação de alguns de seus jogadores no esquema, o Perugia foi punido com a perda de cinco pontos na Serie A 1980-81 e não conseguiu reagir, terminando o campeonato rebaixado. Pin, já titular absoluto, atuou em 27 das 30 partidas da malfadada trajetória e, apesar do destaque obtido, seguiu no time biancorosso na segundona. Mostrando atributos como boa técnica, força física e capacidade apurada de leitura dos lances a partir do primor no posicionamento, deixaria a Úmbria em 1982, com 75 jogos no currículo, depois que os grifoni amargaram o sexto lugar no campeonato e não retornaram imediatamente à elite.

O próximo passo do defensor, que já integrava a seleção sub-21 da Itália, com a qual disputou o Europeu da categoria, em 1982, foi acertar com a Fiorentina, equipe em que teria o ápice de sua carreira. Pin chegou a um ambiente machucado pela recente, dolorida e polêmica perda do scudetto para a Juventus, num desfecho que acirrou o ódio dos gigliati pela gigante de Turim. Celeste ainda teria a dura missão de substituir o campeão mundial Pietro Vierchowod, que estava emprestado pela Sampdoria e foi cedido à Roma.

Pin poderia ter se deslumbrado por ter chegado a uma equipe grande e forte como a Fiorentina, situada numa cidade repleta de belezas, como Florença. Mas, em campo, continuou demonstrando grande seriedade e entregando solidez; fora dele, cultivava uma ética de conduta pouco comum, sempre atento ao coletivo e ao clube, jamais à vaidade, até preferindo que os holofotes se voltassem a terceiros. Mesmo sem os atributos explosivos de outros zagueiros da época, soube se adaptar a parceiros de retaguarda distintos sem perder consistência ou identidade. Pela Viola, aliás, formaria um trio fortíssimo com o duro Renzo Contratto e o craque Daniel Passarella na fase inicial de sua passagem pela Toscana.

No início da década de 1980, sob o comando de Giancarlo De Sisti, ex-jogador violeta, a Fiorentina sonhou com a glória algumas vezes – como o vice-campeonato de 1982 deixou evidente. Pin, Contratto e Passarella formaram um entrosado tridente defensivo, no qual os dois primeiros eram responsáveis por resguardar as subidas do líbero argentino, muito ativo nas transições do time. Em 1982-83, os gigliati tiveram a terceira defesa menos vazada da Serie A, com 25 gols sofridos em 30 rodadas, mas a equipe terminou em quinto lugar, a um pontinho de uma vaga nas competições europeias. Os torneios de mata-mata, aliás, foram outra fonte de decepção, devido a quedas precoces na Coppa Italia (fase de grupos) e na Copa Uefa (primeira eliminatória, para o U Craiova, da Romênia).

Já em 1983-84, a Fiorentina de De Sisti privilegiou um futebol ofensivo, mas mesmo assim o triunvirato formado por Pin, Contratto e Passarella se destacou numa excelente campanha: a Viola foi terceira colocada da Serie A e garantiu vaga na Copa Uefa. Naquele ano, Celeste jogou mais uma Euro Sub-21 e ajudou a Itália a ser terceira colocada. Entretanto, apesar do bom rendimento em Florença, jamais vestiria a camisa da Nazionale adulta.

O defensor começou a se firmar no período em que o escândalo Totonero atingiu o Perugia em cheio (Bagalini)

Pin seguiu mostrando um bom futebol mesmo depois que De Sisti teve de deixar o comando da Fiorentina, por motivos de saúde, na reta final de 1984 – inclusive, os últimos meses de gestão do técnico coincidiram com uma séria lesão que afastou Celeste dos gramados. Recuperado, manteve seu nível em temporadas de rendimento coletivo irregular, como as de 1984-85 e 1985-86, quando a Viola até foi semifinalista da Coppa Italia, mas flertou com a zona intermediária da tabela do campeonato: nona colocada na primeira campanha citada, sob as ordens de Ferruccio Valcareggi a partir de dezembro do ano já citado; e quinta, com vaga na Copa Uefa, na outra, comandada por Aldo Agroppi.

Os três anos seguintes acabaram não sendo bons para a Fiorentina, que fez campanhas pouco convincentes na Serie A e nas copas. Para Pin, foi um período de transformações: em 1986, o trio de zaga gigliato foi desfeito, pela ida de Passarella para a Inter, e a dupla com Contratto só durou até 1988, quando o colega rumou à Atalanta. Celeste, por sua vez, foi titular na gestão de Eugenio Bersellini (1986-87), quando a Viola teve a terceira pior defesa do campeonato, e perdeu espaço com o sueco Sven-Göran Eriksson (1987-89), que lhe colocou atrás do compatriota Glenn Hysén e de Stefano Carobbi na hierarquia do elenco.

Pin recuperou seu lugar cativo no onze inicial da Fiorentina em 1989-90, com Bruno Giorgi. Foi um ano bastante complicado para a equipe violeta, que em vários momentos foi forçada a jogar em cidades diferentes, como Pistoia e Perugia, devido às obras de reestruturação do então estádio Comunale para a Copa do Mundo – só em 1991 a praça esportiva receberia o nome do ex-dirigente Artemio Franchi. Na Serie A, a temporada foi péssima e a Viola só se salvou do rebaixamento na última rodada, depois que Francesco Graziani substituiu o treinador que iniciou a campanha. Na Copa Uefa, o roteiro foi bem diferente. E o zagueiro guardou recordações que o deixariam inflamado até o fim de sua vida.

Superando expectativas, a Fiorentina chegou até a decisão europeia, mas acabou batendo na trave, após ser derrotada pela Juventus num embate repleto de polêmicas. Primeiro, a Uefa puniu a Viola com a perda do mando de campo da partida de volta das finais, por conta de uma confusão em Perugia, nas semifinais contra o Werder Bremen, e levou o confronto para um reduto da torcida da rival – Avellino, no sul da Itália. Além disso, na ida, em Turim, a vitória bianconera por 3 a 1 teve um gol claramente irregular validado pela arbitragem: no segundo tento da Velha Senhora, anotado quando o jogo estava empatado, Pierluigi Casiraghi empurrou Pin e acabou marcando na sequência do lance, com o zagueiro no chão.

O zagueiro vêneto, habitualmente calmo, terminou o jogo furioso. “Não vou falar nada, porque se não falarei demais [e posso me complicar]. Mas na volta, venceremos por 2 a 0, e merecidamente. Por todos os amantes do esporte na Itália”, declarou à Rai, ainda nos vestiários. Seu desejo não se tornou realidade, entretanto – e ele jamais escondeu a frustração diante dos acontecimentos que acabaram com a maior chance de levantar um troféu importante em sua carreira.

Nos anos 1980, Celeste formou uma forte defesa em Florença (Guerin Sportivo)

Anos mais tarde, Pin ainda afirmou que, logo depois do gol, Casiraghi teria ironizado sobre o fato de a infração não ter sido marcada: “lembre-se de que nós somos a Juve” foi a frase que Celeste sustentou ter sido dita pelo adversário. “Sabíamos que estava tudo direcionado. Mas, dali em diante, me tornei mais torcedor da Viola do que nunca”, declarou o ex-defensor em entrevista ao tradicional jornal La Nazione, de Florença.

Quis o destino que a decepção de Pin na final da Copa Uefa fosse um de seus últimos atos como jogador da Fiorentina. Em 1990, a família Pontello, então proprietária da agremiação, a vendeu para o produtor cinematográfico Mario Cecchi Gori, que buscou o brasileiro Sebastião Lazaroni – o que abreviou a passagem do vêneto pela equipe toscana. O novo técnico o utilizou em apenas 15 das 40 partidas dos gigliati, numa temporada de metade inferior da tabela, e Celeste, então com 30 anos, terminaria por dar lugar a atletas mais jovens numa reformulação de elenco. Ao longo de quase uma década de serviços prestados, somou 268 aparições com a camisa violeta e se tornou uma bandeira da instituição.

Após deixar Florença, Pin acertou com o Verona, que voltava à elite depois de um ano na Serie B – e com a expectativa de repetir a sua maior sequência de temporadas consecutivas na máxima categoria; oito, de 1982 a 1990. Nada deu certo, contudo. Atravessando sérios problemas financeiros, o Hellas não engrenou com Eugenio Fascetti e os esforços de Nils Liedholm, assessorado por Mario Corso, foram em vão: o rebaixamento se consumou na penúltima rodada.

Pin foi titular absoluto na péssima campanha do Verona e manteve o posto em trajetórias igualmente esquecíveis do time nas três edições seguintes da Serie B – nas quais o Hellas, envolto em sua grave situação societária, sequer brigou pelo acesso. No total, o vêneto acumulou 137 partidas pelo clube mais vitorioso de sua região e, em 1995, voltou para a Toscana na intenção de se aposentar. Celeste acertou com o Siena, da terceirona, e, depois de uma temporada em que vestiu a camisa bianconera em 31 das 34 rodadas do certame, encerrou sua carreira aos 35 anos.

O ex-zagueiro, entretanto, seguiu ligado ao futebol. Após obter sua qualificação como diretor esportivo em maio de 1997, Pin continuou morando em Florença e ocupou cargos em clubes modestíssimos da Toscana, como Montemurlo e Affrico. Passou também pelas categorias de base da Fortis Juventus e, por mais de uma década, foi gerente geral do Club Sportivo Firenze, uma agremiação poliesportiva da cidade que adotou. Celeste também se tornou comentarista, colaborando com veículos como o Tutto Mercato Web, e se dedicou ao setor imobiliário.

Depois de ter amargado decepção pela Fiorentina na final da Copa Uefa, em 1990, Pin se declarou ainda mais apaixonado pela equipe (Olympia)

Evidentemente, o ex-jogador continuou a participar de eventos da Fiorentina, de seus clubes de torcedores e da imprensa esportiva local, ratificando o laço indissolúvel que criou com a região e a camisa gigliata. Por conta da paixão e da excelência com a qual defendeu a Viola, Pin foi incluído no Hall da Fama da agremiação, em 2022. Não à toa, foi dignamente homenageado após o seu falecimento.

Em 22 de julho de 2025, aos 64 anos, Pin foi encontrado morto em seu apartamento em Florença, perto das colinas de Careggi, ao norte da cidade. As circunstâncias investigadas pela polícia apontaram para o suicídio e, como não poderia deixar de ser, a notícia provocou choque profundo. A Fiorentina emitiu comunicado oficial com palavras do presidente Rocco Commisso, do diretor esportivo Daniele Pradè e do técnico e amigo Stefano Pioli, de quem Celeste foi colega de zaga na própria Viola, entre 1989 e 1991.

“Além de honrar a camisa violeta por muitos anos como jogador, Celeste foi um torcedor da Fiorentina e nunca deixou de oferecer sua solidariedade e apoio em todas as ocasiões, tanto públicas quanto privadas”, comunicou a agremiação em nota. “É por isso que ele permanecerá, para sempre, na história gigliata”, concluiu.

Se a morte chegou de forma inesperada e trágica, ela não apaga o que a vida deixou como saldo. Pin não foi pivô de escândalos nem de epopeias midiáticas e, por isso, desfrutou de algo mais raro: o respeito. Em suma, da deferência da torcida, dos colegas, dos técnicos e da cidade que o adotou, por sua afirmação como símbolo de integridade e amor à camisa. Na Florença do futebol, sua lembrança segue intacta, firme como as travas de suas chuteiras no gramado do antigo Comunale.

Celeste Pin Nascimento: 25 de abril de 1961, em San Martino di Colle Umberto, Itália Morte: 22 de julho de 2025, em Florença, Itália Posição: zagueiro Clubes: Perugia (1979-82), Fiorentina (1982-91), Verona (1991-95) e Siena (1995-96)

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