Gazeta Esportiva.com
·08 de março de 2022
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Em meio ao canto dos torcedores em um pequeno estádio em Cartum, Salma al-Majidi orienta suas jogadoras: formada há menos de um ano, a seleção feminina de futebol do Sudão enfileira derrotas, mas sua existência por si só já é uma conquista.
Elas enfrentam o Sudão do Sul praticamente sem ter tido como treinar devido à situação de seu país, onde a cada semana manifestantes são mortos em meio à repressão contra os que denunciam o golpe de Estado do general Abdel Fattah al-Burhan.
Isso não afeta a determinação de Salma, que aos 30 anos já quebrou vários tabus em um país que em 2019 saiu de uma ditadura militar-islâmica que proibia as mulheres de jogar futebol.
Para superar esse obstáculo, ela decidiu ser treinadora, tornando-se a primeira mulher a comandar times masculinos no mundo árabe, onde muitas vezes as mulheres são excluídas tanto da vida política quanto dos campos.
Apesar de ter conseguido muitas vitórias com seus times masculinos, Salma admite: “As meninas ainda estão dando seus primeiros passos nos torneios internacionais”.
Prova disso foi a derrota por 6 a 0 para o Sudão do Sul em amistoso disputado em fevereiro. Antes, perderam para Egito, Tunísia, Argélia e Líbano.
“Embora tenham bem menos experiência que as outras, estão melhorando”, diz à AFP a treinadora.
(Foto: ASHRAF SHAZLY / AFP)
Em um dos países mais pobres do mundo, as jogadoras não só dispõem de pouca estrutura, como também têm que enfrentar problemas que refletem no calendário de jogos.
No dia 26 de outubro do ano passado, a seleção sudanesa deveria enfrentar a Argélia pela Copa Africana de Nações, mas o golpe de Estado ocorrido 24 horas antes fez com que a partida fosse cancelada.
“Pouco importam as anulações e as derrotas”, diz a capitã sudanesa Fatma Jada, que nos tempos da ditadura jogava futebol em segredo.
Naquela época, “tínhamos que procurar lugares isolados” porque “as pessoas eram contra” a ideia de mulheres jogarem futebol e “quando nos viam jogando, nos expulsavam do campo”, conta Fatma.
Nos tempos da ditadura, a lei previa que mulheres acusadas de ingerir bebidas alcoólicas ou usar um vestido considerado “indecente” deveriam receber chibatadas em praça pública.
Após a queda do presidente Omar al-Bashir, quando os civis assumiram a transição, várias leis que discriminavam as mulheres foram retiradas, o que tornou possível a criação do primeiro torneio de futebol feminino do país.
No entanto, o governo militar tem se mostrado repressor contra os civis, e as liberdades conquistadas na revolução podem se perder.
Ainda assim, Salma se mostra otimista quanto ao futuro do esporte no Sudão.
“Os sudaneses agora aceitam mais o futebol feminino”, conta a treinadora, que já tem um novo projeto em mente: o torneio feminino do Conselho das Associações de Futebol da África Oriental e Central (CECAFA).