Zerozero
·8 décembre 2025
Um português louco pelo Bayern: «Já estive 30 minutos à conversa com o Neuer»

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·8 décembre 2025

Telmo Melo é português, nascido na cidade do Porto em 1980, mas o clube por quem vibra e tem uma devoção digna de um adepto fanático está a 2273 quilómetros de distância. É o sócio número 222362 dos bávaro e entre as demonstrações de amor que já fez ao gigante da Baviera está uma semana de férias na unidade hoteleira de Sintra, ao mesmo tempo que o Bayern München disputou a final-eight da UEFA Champions League de 2020, conquistada no Estádio da Luz.
Mentalidade, dedicação, sentimento de família e um clube que só pensa em ganhar, nunca esquecendo um estilo de jogo de conquista e de vertigem. As características que levaram Telmo Melo a apaixonar-se pelo futebol alemão no início dos anos 90 e, por consequência, do Bayern München, mantêm-se intactas.
Nesta entrevista ao zerozero, o português de 45 anos explica como foi crescendo a sua paixão pelo emblema de Munique, ao ponto de ter criado um clube de fãs em Portugal.
zerozero: Qual a justificação para ser sócio do Bayern München?
Telmo Melo: Fazer parte da família, sentir essa conexão, apesar de distância, e estar aproximado do meu clube. Foi por isso que tomei essa decisão. Eu quis fazer parte da família do Bayern München pelos seus ideais e a minha visão de ver o futebol. Tudo isso fez-me sentir apaixonado pelo clube. É um sentimento que prolifera pela Baviera e no meio da dimensão futebolística que vive de paixões e loucura, o Bayern München sempre soube ser racional na tomada das decisões, ao longo das épocas. A juntar a tudo isso, as conquistas do clube, que ao longo dos anos me apaixonando. Por isso, sou adepto há 35 anos e sócio há 15 anos.
zz: Como é que uma criança nos anos 90 se torna adepto do Bayern München?
TM: O meu pai foi treinador de futebol e nsinou-me o jogo e a gostar do jogo, não das camisolas. Eu jogava na formação do FC Porto e foi nessa altura que me tornei adepto do Bayern München. Naturalmente havia uma afinidade pelo clube, porque o meu pai é portista ferrenho, mas ao ensinar-me o jogo, o meu pai mostrou-me as glórias e eu via as antigas competições. Estamos a falar de 1990, o acesso à informação era muito restrito, mas havia umas coleções de mundiais e europeus. Fui-me guiando por esses grandes eventos e esses grandes jogadores para perceber o que era o futebol. Nessas equipas havia sempre uma raiz comum: a Alemanha e a base da sua seleção, que eram jogadores do Bayern München.
zz: O que mais o fascinou?
TM: A forma de encarar o jogo, o positivismo com que se jogava, os jogadores quererem sempre marcar mais um, os jogadores não quererem perder tempo, nem estarem sempre no chão. Eu não percebia muito a língua, mas ia sempre acompanhando. Só se falava de futebol e isso fez-me afastar da realidade do futebol português e apaixonar-me cada vez mais por este clube. Aprofundei o conhecimento pelo clube, a dimensão que tinha na Alemanha e no Mundo, apesar de ter muita dificuldade em chegar a essa informação, mas cada bocadinho que ia conquistando, ia preenchendo o meu coração.
zz: Tinha alguma antena parabólica para ver os jogos?
TM: Claro. Eu e o meu irmão, que é apaixonado pelo futebol inglês e adepto do Wimbledon, conseguimos conquistar uma parabólica... Não havia jogos em direto, mas a SAT, ao final da tarde, passava resumos de oito minutos da Bundesliga, e como não revelavam o resultado, havia muita emoção para saber o resultado. Se não estivesse em casa, programava no gravador de VHS - vídeo home system (cassetes de vídeo) - para depois ver mais tarde. Se não conseguisse, só na semana seguinte é que sabia o resultado, porque chegar a informação a Portugal era muito difícil.
zz: Quando o FC Porto ganhou a Taça dos Campeões Europeus ao Bayern München já era adepto do Bayern München?
TM: Não, era adepto do FC Porto e fui para a Avenida dos Aliados festejar... Três anos depois, foi um dos maiores arrependimentos da minha vida... (risos)
zz: Uns anos mais tarde festejou com um bem-amado do FC Porto dessa final, que foi o Hansi Flick, o treinador que lhe deu a sexta Champions.
TM: Só muitos anos depois é que me apercebi que era o Hansi Flick que estava sobre a linha de baliza, no golo do calcanhar do Madjer... Mas, sim, o Hansi Flick marca uma Era no Bayern München, é uma das minhas grandes paixões dentro do clube e é uma das minhas grandes tristezas ele não estar no clube nesta altura. Foi ele que me deu uma felicidade enorme, nessa conquista da Champions em Lisboa.
zz: Qual foi o maior ato de amor que cometeu pelo Bayern München?
TM: Ir a Munique e vir no próprio dia, só para ver um jogo. Foi um duelo contra o Dortmund, nos tempos do Thomas Tuchel. Isto para um adepto que não gosta de andar de avião...
zz: O que lhe deu na cabeça para se instalar no mesmo hotel do Bayern München na semana da Champions que foi conquistada em Lisboa?
TM: Descobri onde o Bayern München ia ficar instalado, que era numa unidade hoteleira em Sintra, e tenho a sorte de ser casado com a melhor mulher do Mundo e ela permitiu que fossemos passar uma semana de férias nesse sítio. Esse foi o grande ponto de viragem para a relação atual que eu tenho com o Bayern München, pois me permitiu conhecer pessoas da estrutura com quem mantenho amizade e troco mensagens com regularidade. Fiquei ainda mais apaixonado pelo clube.
zz: Como foi essa semana?
TM: Não conseguimos contactar com os jogadores... Estamos a falar do período forte do Covid-19, o Bayern levou cerca de 60 pessoas e só 20 é que estavam com os jogadores, os restantes não podiam ter qualquer contacto. Eram instalações separadas e via os jogadores a passar à nossa frente, mas eu queria tanto que eles conquistassem a sexta Champions que não ia aproximar-me deles para colocar em risco qualquer um.
zz: Mas houve contacto com outras pessoas?
TM: Estive quase uma hora à conversa com Rummenigge e se alguém me dissesse isso uma semana antes, eu acharia impossível. Eu cruzava-me com eles nas áreas comuns do hotel, no pequeno-almoço, no bar do hotel, na piscina, no ginásio... Numa dessas vezes tive que chegar à fala com o Rummenigge... Para mim há duas grandes pessoas que fazem a transformação do Bayern München... O Bayern era um clube que era tricampeão europeu, mas nem uma sede tinha e hoje é colosso mundial. Ele estava rodeado de seguranças e staff do Bayern, mas percebeu que eu queria falar com ele e contei-lhe a minha história.
zz: Qual foi a reação?
TM: É difícil, na cabeça de um alemão perceber esta paixão vinda de um português, mas depois desse primeiro contacto, tivemos várias vezes juntos durante a semana.
zz: E trouxe outras pessoas para conhecer?
TM: Sim, desde o chefe de segurança, o CEO da Adidas, o Herbert Hainer, que é o homem que o substituiu e depois apresentei-me a uma pessoa que me é muito especial e personifica muito o que é ser Bayern München, que é o Élber. Com ele construí uma amizade díspar... Estou sempre com ele quando vou a Munique, já jantei em casa dele, é um brasileiro que é alemão ao mesmo tempo. Temos a língua em comum e é um dos seres humanos mais fantásticos que conheci até hoje.
zz: Quem foi a outra pessoa que reformulou o clube, além de Rummenigge?
TM: Hoeness... Foram eles os dois que fizeram a grande mudança. Depois é que aparecem os treinadores. A gestão acredito que começou na altura em que o Uli Hoeness vende o querido amigo Rummenigge ao Inter de Milão e criam a célebre conta bancária com depósito a prazo que ainda hoje existe... O Bayern München orgulha-se de nunca ter estado em défice e ter as contas organizadas. Essas, para mim, são as duas principais pessoas e depois há a terceira pessoa, que foi o Franz Beckenbauer... Foi capitão, treinador, dirigente, presidente e isto também é algo que me apaixona no clube... As pessoas serem várias coisas no clube e não serem esquecidas e passarem o ADN de Mia San Mia...
zz: O que significa Mia San Mia?
TM: Nós somos nós. Esta é a tradução literal, mas quer dizer várias coisas. Mais do que ser bávaro, é a ideia de um clube que nunca desiste, que tem uma identidade muito própria, que acredita sempre, que tem uma arrogância saudável, pois acha que é melhor que os outros, mas tenta todos os dias provar dentro das quatro linhas que é melhor. É uma resiliência que faz parte de Munique... Mia San Mia pode ter um significado diferente, mediante a pessoa que o estiver a dizer. Somos invencíveis, mas vamos lutar em campo para ser.
zz: Como foi o pós-jogo da vitória da Champions em Lisboa?
TM: Eu ainda guardo na minha memória visual o que via do meu quarto de hotel... Ficava virado diretamente para o edifício onde estava a ser feita a festa... Passaram pelo meu corredor o Salihamidzic, o Élber, o Karl-Heinz Rummenigge... o Élber, quase de lágrimas nos olhos, dizia que se pudesse levava-me para a festa, mas a festa só foi aberta a familiares, que tiveram de fazer quarentena para poderem estar presentes na festa. Eu só quis ser campeão, naquela altura estava com a minha mulher e estávamos felizes, porque estávamos a celebrar.
zz: Foi nessa altura que mostrou a réplica da Allianz Arena ao Hansi Flick?
TM: Foi. Eu criei uma Allianz Arena em miniatura e reproduzia no hotel, numa zona onde os jogadores passavam para ir treinar, com uma mensagem: Bem-vindos a Portugal.
zz: Tem muitas camisolas do Bayern München?
TM: Tenho cerca de 50, mas sonho com o dia em que vou ter todas. A primeira que tive foi uma réplica do meu primeiro jogador favorito do Bayern München: Mehmet Scholl. Ele foi o meu primeiro ídolo do Bayern, depois veio o Lothar Matthaus, pois no primeiro ano o Matthäus ainda estava no Inter de Milão.
zz: O que o fez gostar do Mehmet Scholl?
TM: A irreverência dentro da lógica do futebol alemão. Era um jogador que tanto jogava à esquerda como à direita, nunca desistia de uma bola e eu revia-me nele, pois jogava na mesma posição. Era um jogador de passe e assistência, de fazer um meio golo para um colega.
zz: Qual a camisola mais importante que tem?
TM: A de 2020, pois é assinada por todo o plantel e foi numa altura em que eu achava que o Bayern München ia dominar o futebol europeu nos próximos dez anos. Foi um ano que vencemos a Champions só com vitórias, apesar de ser um ano atípico. Mas gosto muito da camisola que tenho assinada pelo Hansi Flick. Grandes treinadores fazem grandes equipas e o Hansi Flick assinou-me a camisola comigo de joelhos a pedir-lhe a sexta Champions. Foi um dos momentos mais felizes da minha vida. Espero que ele um dia regresse a Munique.
zz: E treinadores marcantes, quais são?
TM: Jupp Heynches o primeiro. Esteve três períodos no Bayern München e sempre com impacto. Para mim, ele personificava o futebol rolo compressor. Estávamos a dar seis aos 89 minutos e era preciso marcar o sétimo... Isto, para mim, é respeitar o adversário. A par dele, o Hansi Flick e o Ottmar Hitzfeld.
zz: O que achou da saída de Thomas Müller?
TM: Inaceitável. Vi o Bayern München a tomar quase sempre boas decisões até 2020, depois saíram o Uli Hoeness e o Rummenigge, em que a passagem não correu nada bem. As coisas foram melhorando, mas a saída do Thomas Müller é uma machadada. Quem é adepto do Bayern München sabe o que ele representa. Quem sabe o que ele fez pelo nosso clube, sabe que ele é a personificação do Mia San Mia e acho triste ele ter saído, acho desnecessário... Compreendo que dentro das quatro linhas não desse o que já tinha dado, mas deviam ter encontrado uma solução para ele continuar no clube. Ele vai ser treinador, ele vai ser diretor desportivo, ele vai ser presidente. Ele vai ser o próximo Uli Hoeness e o próximo Rumminigge. Fico triste por ele ter saído e fico triste por ele usar outra camisola.
zz: Vai muitas vezes por ano a Munique?
TM: Tento sempre ver, pelo menos, dois jogos por ano em Munique.
TM: Óbvio. A última vez que o Bayern München jogou contra o Benfica em Lisboa estive no estádio e fui jantar com a equipa ao hotel. Já tinha feito as amizades com várias pessoas e estive mais de meia hora à conversa com o Manuel Neuer... São coisas únicas... Aquilo é a minha Eurodisney.









































