Trivela
·28 de novembro de 2022
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Os irmãos Ayew levarão pelo resto da vida o rótulo de “filhos de Abedi Pelé” onde quer que estejam, sobretudo num campo de futebol. Para Jordan, ainda assim, a sombra era um pouco maior por causa do irmão André. Dedé foi quem despontou primeiro e marcou seu nome na empolgante campanha de Gana na Copa de 2010. Jordan teve o “azar” de chegar depois, fora daquela epopeia na África do Sul. André também viveu momentos mais reluzentes por clubes, embora a consistência de Jordan desde que chegou à Premier League seja maior. E o momento de vencer num Mundial finalmente chegou ao caçula. Mohammed Kudus, é verdade, saiu como o melhor em campo na insana vitória por 3 a 2 sobre a Coreia do Sul. Jordan Ayew, de qualquer maneira, seria essencial por suas investidas na esquerda. Merecia o prêmio de “melhor ator coadjuvante” dos Estrelas Negras.
Nascido em 1991, Jordan Ayew é o único dos filhos boleiros de Abedi Pelé que traz na certidão de nascimento o ápice de seu pai. O ponta nasceu em Marselha, onde seu ídolo-mor fazia maravilhas com a camisa do Olympique e conquistou inclusive a Champions League. A identificação com Gana, porém, nunca foi uma questão na casa dos Ayew. Abedi permaneceu como uma referência dos Estrelas Negras, mesmo sem nunca alcançar a Copa do Mundo, e o tio Kwame tinha uma medalha de bronze olímpica em casa. Tanto André quanto Jordan sempre se disponibilizaram aos ganeses, independentemente de terem nascido na França.
O Olympique abriu suas portas a Jordan e o garoto passou pelas categorias de base do clube, antes de se profissionalizar aos 18 anos. Porém, com sua estreia em dezembro de 2009, ficou tarde demais para cavar seu espaço na seleção adulta de Gana rumo à Copa de 2010 – mesmo participando de alguns jogos na campanha do título da Ligue 1 em 2009/10. O adolescente precisou apenas assistir às façanhas vividas por André, dois anos mais velho e já campeão mundial sub-20, na África do Sul. Ficou a vontade de também triunfar e a estreia do caçula não demorou. Jordan disputou seu primeiro jogo pelos Estrelas Negras em setembro de 2010.
Além do que fez na Copa de 2010, André Ayew rendeu mais em seus primórdios pelo Olympique de Marseille e se transferiu à Premier League. Jordan não teve o mesmo impacto pelos celestes e rodou um bocado. Estava no Sochaux quando teve sua primeira oportunidade em uma Copa do Mundo. Jordan começou como titular no Mundial de 2014, mas perdeu espaço na sequência da competição e passou a sair do banco nos compromissos seguintes. Também não foi uma campanha lá muito digna dos Estrelas Negras, marcada pela bagunça nos bastidores e com apenas um ponto conquistado. A seleção enfrentou uma entressafra nos anos seguintes, com a saída da geração que disputou três Copas. O sobrenome dos Ayew não foi suficiente para garantir um lugar no Mundial de 2018.
Gana também perdeu o bonde para conquistar a Copa Africana de Nações. Jordan Ayew participou do torneio em 2015 e inclusive converteu seu pênalti na decisão contra a Costa do Marfim, mas os ganeses amargaram mais um vice. O desempenho caiu gradativamente, até o fundo do poço com a eliminação na fase de grupos em 2022. Seria a pior campanha da história dos Estrelas Negras no torneio continental, em que a presença dos Ayew pouco significou ao país.
Jordan, ao menos, consolidou seu caminho por clubes. Depois do Sochaux, a passagem pelo Lorient seria importante para elevar seu moral em 2014/15, como um dos melhores pontas da Ligue 1. Transferiu-se ao Aston Villa e, se acabou rebaixado, depois conseguiu uma transferência para seguir na Premier League com a camisa do Swansea. Por lá, teve bons momentos e inclusive compartilhou o elenco com André. Mas se Dedé perderia fôlego em sua carreira, o mesmo não aconteceu com Jordan. O caçula assinou com o Crystal Palace e virou uma referência da equipe. É um atleta importante por sua leitura de jogo e pela maneira como se dedica. Nem possui números tão dilatados em gols ou assistências, mas os 149 jogos disputados representam seu peso.
Assim, quando Gana temia não se classificar à Copa de 2022, Jordan continuou no grupo como uma liderança – o que não aconteceu com André, ausente na fase final das Eliminatórias. Foram dois empates contra a Nigéria, com a classificação só garantida pelos gols fora. Jordan não decidiu, mas serviu de referência a um grupo bastante jovem. E seria preservado rumo ao Mundial do Catar, com o retorno de André às listas do técnico Otto Addo. Se os ganeses oferecem seu melhor através dos talentos em ascensão, também é importante contar com a rodagem internacional dos filhos de Abedi Pelé.
Jordan Ayew começou apenas no banco durante a estreia da Copa de 2022, contra Portugal. Entrou no meio do segundo tempo, no lugar de Dedé, logo após seu irmão marcar o gol de empate. O problema é que o time se bagunçou e a participação do ponta acabou ofuscada pela derrota por 3 a 2. Já nesta segunda-feira, os ganeses contaram com Jordan e André na ligação. A equipe funcionou melhor, muito pelo dinamismo de Mohammed Kudus pelo lado direito do meio-campo, mas também pelas investidas de Jordan na esquerda.
Ao longo dos 78 minutos em que ficou em campo, Jordan Ayew esteve entre os melhores do time. O ponta fez aquilo que está acostumado no Crystal Palace: um trabalho por vezes despercebido, mas fundamental pela consistência. Conseguiu bloquear bem as subidas da Coreia do Sul pela esquerda, com direito a três desarmes. Ganhou a maioria das divididas. E errou raríssimos passes. O talento de Jordan se expressou melhor em forma de cruzamentos. Foram dois decisivos, que geraram os dois primeiros tentos dos Estrelas Negras. Mandou a bola no pagode que Mohammed Salisu definiu e depois levantou para a casquinha de Kudus. Também esteve envolvido no terceiro tento, com o passe antes da assistência de Gideon Mensah.
Não parece haver mais tempo para Abedi Pelé se tornar meramente o “pai de Jordan Ayew”. O ponta, de qualquer maneira, agora leva para a prateleira de casa uma grande partida em Copas do Mundo para exibir ao lado de Dedé. É uma família com muitas histórias vividas graças à bola e o caçula também tem sua vitória no maior palco de todos. Merecia isso, não só pela carreira que construiu, mas também para deixar no passado a decepção de 2014. Quem fica para trás é o irmão mais velho da dupla, Ibrahim, o primogênito de Abedi. O lateral até chegou à final da CAN 2010 e foi reserva no Mundial da África do Sul, mas não entrou em campo. Aos 34 anos, atualmente defendendo o Bruno's Magpies de Gibraltar, não tem mais tempo para uma reviravolta. Mas pode se orgulhar do caçula Jordan, numa casa onde os três filhos de Abedi Pelé terão vivências de Copa do Mundo para compartilhar.