
Calciopédia
·16 de setembro de 2025
Soberana, a Juventus não teve piedade do Borussia Dortmund na Champions League 2014-15

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·16 de setembro de 2025
Alguns confrontos da Champions League se transformam em encruzilhadas capazes de redefinir a trajetória de um time. Isso ocorreu, por exemplo, em 2014-15, no duelo de oitavas de final entre uma Juventus em transição, dirigida por um Massimiliano Allegri cercado de dúvidas, e o Borussia Dortmund embalado pelo carisma de Jürgen Klopp, que fora vice-campeão em 2013. A forma como os bianconeri dominaram a eliminatória – mostrando equilíbrio na Itália e se impondo na Alemanha – deu contornos inesperados àquele percurso. O contestado treinador da Velha Senhora herdara uma equipe vitoriosa de Antonio Conte e, com o triunfo sobre os aurinegros, a fez dar um importante passo no caminho de volta às grandes decisões europeias.
A temporada 2014-15 da Juventus girava em torno de uma célebre frase de Conte para justificar os seus fracassos em competições continentais: “não se pode ir a um restaurante de 100 euros com apenas 10 no bolso”, disse ele. O antigo comandante havia deixado o cargo convencido de que, sem reforços de peso, a Velha Senhora não teria condições de competir no mais alto nível europeu. Allegri chegou a Turim imbuído de superar o antecessor e acabou expondo o equívoco dessa leitura. Com os mesmos recursos, o novo treinador foi capaz de levar a equipe além, provando que era possível sonhar alto mesmo sem investimentos comparáveis aos feitos por grandes rivais do continente.
Sua chegada, no entanto, esteve longe de ser festejada. A desconfiança da torcida e da imprensa em Allegri beirava a hostilidade, não apenas por suceder um técnico vitorioso, mas também pelo desgaste de sua própria trajetória naquele momento. O treinador conquistara um scudetto com o Milan, mas encerrara sua passagem pela Lombardia em meio a más escolhas táticas, queda de rendimento e perda de autoridade no vestiário. Em Turim, parecia condenado a ser uma solução de emergência, mas, ao contrário, rapidamente reverteu o clima com resultados e uma gestão mais serena do elenco.
Parte dessa virada passou pela coragem de romper com o 3-5-2 que havia marcado a era Conte. Allegri adotou o 4-3-1-2 como base, valorizando a fortaleza do meio-campo e, ao mesmo tempo, demonstrando flexibilidade ao ajustar o desenho de acordo com o adversário e a necessidade de cada partida. A meta não se limitava a manter a hegemonia na Serie A, mas alcançar a afirmação continental que escapara ao antecessor. Tornar a Juventus competitiva na Champions League significava, em última instância, desmontar o argumento do apuliano e escrever sua própria versão de sucesso.
Na conta de Carlitos: Tevez teve atuação decisiva nos dois jogos com o Borussia Dortmund naquela Champions League (AFP/Getty)
Na Champions League, a Juventus ficou na segunda posição do traiçoeiro Grupo A, com os mesmos 10 pontos do Atlético de Madrid. Um empate de compadres entre espanhóis e italianos na última rodada serviu para eliminar o surpreendente Olympiacos, que fez 9 – o Malmö foi o lanterna. Nas oitavas de final, a Vecchia Signora teria pela frente o Borussia Dortmund, que liderou o Grupo D por conta do saldo de gols favorável em relação ao também classificado Arsenal. Naquela chave, o Anderlecht ficou em terceiro, passando à Liga Europa, e o Galatasaray foi eliminado.
Em fevereiro de 2015, italianos e alemães se encontraram para a partida de ida das oitavas, em Turim, e a Juventus soube jogar de forma inteligente para levar a melhor. A estratégia pensada por Allegri para aquela noite foi ceder a posse de bola ao adversário e puni-lo no contragolpe. “Para quebrar o Borussia, você precisa de técnica, precisão e intensidade”, declarou no pós-jogo. A Juve trancou o meio de campo e criou oportunidades nos espaços deixados pelo rival.
O primeiro gol nasceu dessa forma, depois de apenas 10 minutos, quando Carlos Tevez se aproveitou de um vacilo do arqueiro Roman Weidenfeller para deixar sua quarta marca na competição. Álvaro Morata puxou o contra-ataque pela esquerda, avançou para dentro da área e chutou cruzado. O goleiro do Borussia Dortmund soltou a bola no meio da pequena área e Marcel Schmelzer não conseguiu bloquear a finalização do argentino.
Os alemães conseguiram reagir aos 18 minutos, num lance fortuito. Após lançamento proveniente da defesa aurinegra, Giorgio Chiellini parecia ter a bola dominada, mas não conseguiu se manter em pé. O zagueiro da Juventus escorregou e ficou caído no gramado, de cabeça baixa, lamentando a perda da posse para Marco Reus, que bateu na saída de Gianluigi Buffon e empatou. Foi o único lapso da equipe bianconera em casa.
Em sintonia com Tevez, Morata apareceu bem para desempatar a partida em Turim (AFP/Getty)
Depois do empate, a Juventus manteve o domínio e ameaçou os alemães. O segundo gol sairia aos 30 minutos, numa jogada envolvendo a mesma dupla do primeiro tento, com Paul Pogba surgindo como convidado. Tevez passou em profundidade para o francês, que avançava pela esquerda, e o cruzamento rasteiro do meia encontrou Morata no meio da área. Sem marcação, o espanhol bateu bonito para tirar Weidenfeller do lance e devolver a vantagem para os bianconeri.
O time alemão chegou a armar jogadas de ataque que levaram certo perigo ao gol de Buffon – uma finalização prematura de Ciro Immobile, no primeiro tempo, e outra de Henrikh Mkhitaryan, na etapa final, mas Reus e Pierre-Emerick Aubameyang tiveram uma atuação apagada, no geral. Ilkay Gündogan até fez boa partida no meio-campo e permitiu que o Borussia Dortmund tivesse vantagem na posse de bola na etapa complementar, mas nada adiantou.
A melhor oportunidade do segundo tempo, aliás, foi da Juventus, depois que Claudio Marchisio e Tevez tabelaram na entrada da área e o chute rasteiro de Carlitos que desviou na zaga e raspou a trave de Weidenfeller. Mais tarde, aos 86 minutos, Morata teve uma boa chance cara a cara com o goleiro, mas finalizou para fora. No fim das contas, nos lances capitais do jogo, o Dortmund foi punido pela velocidade dos juventinos. Essa parecia ser a chave para a partida de volta. E de fato, três semanas mais tarde, isso se confirmou na Alemanha.
O retrospecto da Velha Senhora fora de casa na Liga dos Campeões não vinha sendo bom: antes de viajar até a Alemanha, eram apenas quatro vitórias nos 16 jogos anteriores. Mas a Juventus havia encontrado os métodos para acabar com a série ruim. Sem Andrea Pirlo, machucado ainda na etapa inicial em Turim, Marchisio, Pogba e Roberto Pereyra deram trabalho ao setor defensivo germânico. Eles tiveram também o auxílio de Tevez e Morata, que não guardaram posição e se movimentaram bastante, confundindo a zaga mandante, liderada por Mats Hummels.
Para encaminhar a vaga da Juve, Tevez já começou o jogo de volta acertando uma pedrada de fora da área (Bongarts/Getty)
O Borussia Dortmund teve que lidar com um baque logo aos 3 minutos. Tevez, que teria noite inspirada, aproveitou um desarme no campo de ataque para dar vantagem à Juventus com um tirambaço de fora da área. A bola viajou numa trajetória praticamente reta, sem oscilações, e Weidenfeller demorou para reagir.
Se defendendo em linha de quatro, a Juventus pouco concedeu aos alemães. Marchisio jogou à Pirlo e Arturo Vidal e Pereyra inverteram as posições para dar mobilidade e fluidez à saída de bola. Defensivamente, ora Tevez, ora Morata faziam a recomposição. O veloz ataque adversário – com Kevin Kampl, Mkhitaryan, Reus e Aubameyang – foi completamente dominado. Aos 27 minutos, a entrada de Andrea Barzagli no lugar do lesionado Pogba fez com que Allegri passasse ao 3-5-2, o que apenas cimentou de vez a muralha alvinegra sob os olhares da Muralha Amarela.
Kampl, durante mais de 50 minutos, foi o jogador mais incisivo do time da casa, mas sequer chegou perto de marcar. Um chute de longa distância de Neven Subotic, já na etapa final, foi o único momento de sufoco para Buffon. Os comandados de Klopp tentaram pressionar, mas não conseguiam ultrapassar a defesa perfeitamente coordenada por Allegri.
Em contra-ataques, Morata parou duas vezes em Weidenfeller antes de enfim marcar, aos 70 minutos. Marchisio descolou belo lançamento em profundidade para Tevez, que se aproveitou do erro de Jakub Blaszczykowski na linha de impedimento – a zaga aurinegra tentou deixar o argentino em posição irregular, mas esqueceu de combinar com o polonês. Carlitos acelerou e, cara a cara com o arqueiro, só rolou para completar para o gol vazio. Aos 79, El Fuerte Apache atacou o mesmo espaço num contragolpe veloz, recebeu de Pereyra e foi fominha, na mais positiva das acepções: sem olhar para ninguém, fuzilou e fez o terceiro. Decisivo, do início ao fim da eliminatória, que teve 5 a 1 favorável aos italianos no placar agregado.
Na metade final do segundo tempo, Tevez deu assistência para Morata e marcou mais um gol – tudo isso em frente à Muralha Amarela (Bongarts/Getty)
Nas três temporadas em que a Juventus foi treinada por Conte, apenas duas das 22 apresentações realizadas na Champions League foram realmente boas – contra o Chelsea, em casa, e contra o Celtic, fora, em 2012. Nenhuma delas se aproximou da exibição que resultou no 3 a 0 aplicado sobre o Borussia Dortmund e levou Klopp a deixar o Signal Iduna Park a pé, desolado e reflexivo. Quando teve seu ex-capitão como treinador, a Velha Senhora se tornou a melhor equipe da Itália naquela época, superando os efeitos colaterais do Calciopoli. Sob as ordens de Allegri, deixou de ser apenas dominante em nível nacional e passou a ser chata, perigosa e, sobretudo, competitiva na Europa.
A Juventus ainda parecia atrás de grandes favoritos daquela edição – Barcelona, Bayern de Munique, Real Madrid, Paris Saint-Germain e Atlético de Madrid pareciam mais fortes. Porém, aquele duelo serviu como um dos pontos de virada para os bianconeri. A partir dali, ficou evidente para os jogadores que era possível ir além do grupo dos oito melhores do continente em 2014-15.
Nas quartas, bastou à Juventus um magro 1 a 0 aplicado no Monaco. Já nas semis, o suado triunfo por 3 a 2 sobre o Real Madrid de Carlo Ancelotti, que defendia o título, empurrou os bianconeri para sua primeira final em 12 anos. Na inédita decisão entre o Barça e a Juve, os italianos brigariam pelo tri e pela tríplice coroa, mas aí foi a vez de o trio MSN, formado por Lionel Messi, Luis Suárez e Neymar, negar a glória aos bianconeri, que tiveram se contentar com a dobradinha nacional naquela temporada – um feito que não ocorria havia duas décadas.
Juventus: Buffon; Lichtsteiner, Bonucci, Chiellini, Evra; Marchisio, Pirlo (Pereyra), Pogba; Vidal (Padoin); Morata, Tevez (Coman). Técnico: Massimiliano Allegri. Borussia Dortmund: Weidenfeller; Piszczek (Kirch), Hummels, Papastathopoulos (Ginter), Schmelzer; Gündogan, Sahin; Aubameyang, Reus, Mhkitaryan; Immobile (Blaszczykowski). Técnico: Jürgen Klopp. Gols: Tevez (13′) e Morata (43′); Reus (18′) Árbitro: Antonio Mateu Lahoz (Espanha) Local e data: Juventus Stadium, Turim (Itália), em 24 de fevereiro de 2015
Borussia Dortmund: Weidenfeller; Papastathopoulos, Subotic, Hummels, Schmelzer (Kirch); Gündogan, Bender (Ramos); Kampl, Reus, Mkhitaryan (Blaszczykowski); Aubameyang. Técnico: Jürgen Klopp. Juventus: Buffon; Lichtsteiner, Bonucci, Chiellini, Evra; Vidal, Marchisio, Pogba (Barzagli); Pereyra; Morata (Matri), Tevez (Pepe). Técnico: Massimiliano Allegri. Gols: Tevez (3′ e 79′) e Morata (70′) Árbitro: Milorad Mazic (Sérvia) Local e data: Signal Iduna Park, Dortmund (Alemanha), em 18 de março de 2015