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·09 de outubro de 2025
Depois de quase trocar a bola pelos livros, Zeca brilha no 'novo' futebol chinês

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"Nunca fui o melhor, fui, talvez, o mais esforçado". É assim que o atacante Zeca se define. Aos 28 anos de idade, o soteropolitano hoje brilha no "novo" futebol chinês na era pós-investimentos massivos, depois de enfrentar algumas barreiras e quase desistir do seu maior sonho para se dedicar aos estudos de engenharia.
José Joaquim de Carvalho veio de uma família com mais condições financeiras, mas, desde sempre, decidiu que seu futuro seria como jogador de futebol e não ao lado dos livros. E foi na cidade de Salvador que o sonhador e batalhador menino começou a dar seus primeiros chutes na bola.
"Eu era um menino que lutava, batalhava, brigava. Talvez eu fosse o menino que mais queria realmente. Não basta ter o dom, se sobressai muito mais quem luta e quem dá o seu melhor todos os dias para realizar o sonho. A gente se dedica no futebol. Às vezes abdica de tudo na vida desde os dez, onze anos", disse o jogador em entrevista exclusiva a oGol.
Ainda nas categorias de base, Zeca defendeu tanto Bahia, por três anos, como Vitória, por seis meses, mas só viu as coisas realmente darem resultado aos seus 20 anos, depois de muitas frustrações nas categorias de base. Em meio a incertezas sobre o futebol no Brasil, o na época jovem atacante foi tentar a sorte em Portugal, com um teste na equipe B do Boavista.
"Estava voltando de uma fratura na face e fui dispensado do Vitória, sem entender muito. O Dejan Petkovic assumiu a diretoria e decidiu que todo mundo que estivesse no último ano de juniores e não fosse titular do time estava fora. Não interessa quem você era, não interessa o que você tinha feito", pontuou
Foi nesse período de incertezas depois da saída do Vitória que Zeca por pouco não largou o futebol para se dedicar aos estudos. Por conta da vontade da mãe, o jogador conciliava os estudos com os treinamentos, mas, em certo ponto, isso se mostrou uma tarefa muito complicada. E foi com a ajuda de seu tio 'Café' que o futebol seguiu como único destino possível, enquanto a engenharia ficaria para depois.
"Esse meu tio é um médico. Ele vira para mim e fala 'você sente que você está um passo atrás de quem você tá disputando no Bahia e no Vitória? Então você tem que largar a faculdade'. Isso gera um choque na minha mãe, mas a gente acaba decidindo por isso, mas muito porque também meu pai sempre viu a minha dedicação. Eu não estava largando a faculdade, largando a escola de molecagem. Então, eu larguei tudo, fui pra Portugal", falou.
"Aí meu empresário arrumou uma avaliação no Boavista B. A equipe jogava a Primeira Liga, mas o time B jogava a Distrital, quarta divisão. Comecei a jogar, era o artilheiro do time, eu tinha cinco jogos, e dez gols, mas ninguém falava nada. Aí tinha um brasileiro que chegou contratado, Gabriel Nunes, que falou para mim um dia: 'não adianta você só fazer gol, você precisa correr'. Aí eu comecei a correr que nem louco no dia lá e acabaram me aprovando", continuou dizendo.
Mas o caminho no futebol europeu também foi sinuoso. Logo no primeiro jogo da quarta divisão do país, Zeca fraturou a clavícula e ficaria fora por algum tempo dos gramados. O que tinha tudo para ser um ponto decisivo de desistência do esporte se transformou em ainda mais motivação para o jogador.
"A ambulância entra no campo, me leva direto para o hospital. Eu fico sentado numa cadeira de roda, segurando meu próprio braço, de 11 horas da noite até 4 da manhã. E eu ficava pensando 'porque você está passando por isso?'. Eu passava seis meses sem receber lá. E aí quando eu bato no leito, eu fechei o olho e acordei. E quando eu acordo, parece que aquele pensamento, toda a questão de desistir tinha evaporado. E uma nova energia, uma nova motivação tinha tomado conta", pontuou.
Dali em diante, o centroavante colheu alguns frutos. Foram 16 gols em pouco menos de 40 jogos para o atacante em Portugal, mas sem subir de categoria, seguindo no time B. Foi quando o clube contratou outro atacante que o brasileiro entendeu que era hora de mudar de ares, para seguir brigando por seu sonho.
Zeca, então, retornou ao Brasil para jogar na equipe sub-23 do Goiás, em 2019. O jogador, porém, também não teve sorte no Esmeraldino e tampouco no Criciúma, onde ficou algum tempo emprestado, mas viu as coisas começarem a fluir no interior de São Paulo, enquanto defendia o Oeste, que disputava a Série C e a Série A2 do Campeonato Paulista naquele ano.
"Eu fui para o Oeste em 2021. Aí na A2 a gente vai muito bem, terminamos a primeira fase da A2 invictos e caímos na semifinal, nos pênaltis. Só que aí, motivado pra jogar a Série C, naquela de 'nosso time é muito bom, vamos subir', a gente faz a pior campanha da história, com seis ou sete pontos. Foi uma coisa deprimente. E aí do nada, o Londrina chega, para a reta final da Série B, com proposta de ganhar um salário mínimo. Eu pensei: 'vou ficar em Salvador para quê?' e eu fui. Foi Deus", completou.
O atacante não desperdiçou a 'chance da vida' no Londrina e fez dar certo. Com quatro gols marcados e três assistências, Zeca ajudou o clube paranaense a evitar o rebaixamento à Série C e, de quebra, descolou uma proposta que mudaria totalmente a sua carreira. Para 2022, Zeca acertou com o Mirassol para o Campeonato Paulista. E, três anos depois, o jogador fez questão de ressaltar a qualidade do projeto do clube, que hoje disputa as primeiras posições da Série A.
"Para quem estava lá, para quem viveu, pelo menos, o mínimo possível lá naquele clube, tinha certeza absoluta que ia chegar onde está hoje. Poderia demorar. Poderia não ser em três anos como foi. Mas para quem viveu ali, viu a estrutura, viu a organização, tinha certeza absoluta que ia dar certo", completou.
No Leão, o jogador balançou as redes seis vezes em 13 partidas e foi o artilheiro da equipe no campeonato estadual. Com o grande destaque induzindo uma transferência para níveis mais altos do futebol brasileiro, Zeca resolveu que era hora de deixar o país, a conselho de seu ex-companheiro de Londrina.
"Quando eu estava no Londrina, eu concentrava com o Robertom atacante. Ele jogou pelo Japão e me falou 'meu maior arrependimento foi ter voltado pro Brasil, eu queria muito ter ficado lá'. E aquilo foi me cativando, é um mercado que paga bem, é um mercado que se vive melhor ainda e se aparecer alguma coisa para lá, eu vou. Eu não esperei chegar nada também no Brasil. Eu queria muito ir, era a oportunidade da minha vida", disse.
Zeca deixou tudo para trás no Brasil e foi tentar a sorte na Coreia do Sul, em um empréstimo do Mirassol para o Daegu. E pode-se dizer que o jogador nem precisou passar por um tempo de adaptação: em sua primeira temporada no futebol asiático, o atacante marcou 16 vezes e deu oito assistências em 38 jogos.
Mas a história com o Daegu não durou tanto tempo. Apesar do grande carinho pelo clube, Zeca sentiu muita demora dos sul-coreanos para firmar um novo vínculo ao fim do empréstimo de sete meses e não pestanejou quando o Pohang Steelers surgiu com um pré-contrato, ainda antes de seu vínculo com o Leão chegar ao fim. Zeca estava de casa nova na Coreia do Sul.
"Eles tinham essa política (de esperar) e essa, para mim, é uma desorganização. Eu vou emprestado, faço um campeonato muito bom. Eu sou muito grato ao Daegu por ter me acolhido quando eu cheguei, mas eles demoraram muito. E eu esperando e nada, nada, nada. E aí aparece um dia uma proposta oficial do Pohang. Melhor um passarinho na mão que dois voando. E aí eles me ligaram e perguntaram 'o que é isso? O que aconteceu?' Eu falei 'vocês demoraram, eu não sabia se vocês iam me querer ou não, eu segui minha vida'", disse o atleta.
No Pohang Steelers, Zeca viveu sua temporada mais participativa da carreira: foram 17 gols e dez assistências do brasileiro em 44 jogos. No clube sul-coreano, o brasileiro foi campeão da Taça da Republica da Coreia e ficou com o vice-campeonato da Liga Coreana.
Para o atacante, o bom desempenho dentro das quatro linhas era algo importante, mas nada perto da experiência e da tranquilidade de jogar no futebol asiático. Foi e continua sendo algo "incrível", nas palavras do próprio jogador, que não quer deixar o continente tão cedo.
"Não importava se ganhasse ou perdesse, eles entendiam que aquilo era uma profissão e que você tinha dado o seu melhor. Aquilo me encantava, me encanta até hoje. Não tenho uma vírgula para falar de nada, só agradecer. Vem sendo incrível a minha passagem por aqui", disse.
O brilho na Coreia rendeu o interesse do Shandong Taishan, antigo Shandong Luneng. Zeca, então, decidiu se aventurar no novo futebol da China, que havia passado um processo de transição das super contratações na década passada, como foi com Hulk, Paulinho e Oscar, para jogadores menos badalados. Os salários estratosféricos já não são mais uma realidade, mas a questão financeira passava longe de ser um problema.
"É muito atrativo porque você vai viver uma vida muito boa, você vai receber muito bem, receber em dia. No Shandong não dá para mensurar. É uma estrutura surreal. O salário já é muito bom e os caras chegaram a pagar 'bichos' aqui de 80 mil dólares por jogo. Vou sair pra quê?", disse.
Contratado em 2024, Zeca passou por uma lesão em seu primeiro ano de China, mas, em 2025, vem tendo a sequência que esperava: são 21 jogos, dez gols e sete assistências. Com o apoio de dois brasileiros, Cryzan e Guilherme Madruga, Zeca segue com a motivação em dia para fazer história. Mas, com o título distante em 2025, a ambição fica para o próximo ano.
"A gente teve pequenos erros durante o campeonato que não poderiam ter acontecido. Era coisa de estar ganhando o jogo de 2 a 0 e tomar a virada. De empatar jogos em casa contra equipes que a gente não podia ter empatado. Isso aconteceu e pronto. A gente, hoje, o foco é terminar o campeonato da melhor maneira possível, como um time. Pensar no ano que vem. Para mim esse ano, pessoalmente, tem sido um ano mais de readaptação", finalizou.